Ao contrário do que alguns meios de comunicação noticiaram, o documento não se limita a propor mudanças na disciplina da Igreja Católica relativamente ao celibato dos padres, à ordenção de mulheres ou à aceitação de casamentos de pessoas do mesmo sexo. Aborda igualmente a crise da vida das paróquias, com a falta de clero e o estabelecimento de unidades 'administrativas' cada vez mais amplas; a necessidade de estrturas participativas na vida da comunidade eclesial, e, ainda, a liberdade de consciência, a reconciliação e o culto.
O parágrafo inicial dá o tom:
Faz agora um ano que os casos de abuso sexual de crianças e adolescentes por padres e religiosos no Colégio Canisius, em Berlim, foram tornados públicos. O ano que se seguiu lançou a Igreja da Alemanha numa crise sem precedentes. A imagem hoje dada a ver é ambivalente: muito tem sido feito para levar justiça às vítimas, reavaliar o mal que foi feito e voltar às causas que levaram ao silêncio, aos abusos e ao discurso duplo nas nossas próprias fileiras. Depois de um primeiro movimento de terror, a ideia impôs-se a muitos cristãos e líderes cristãos, ordenados ou não, quanto à necessidade de reformas fundamentais. Este convite para um diálogo aberto sobre as estruturas de poder e de comunicação, sobre a forma dos ministérios e a participação dos fiéis na responsabilidade eclesial, assim como sobre a moral e a sexualidade, gerou expectativas, mas também uma preocupação. Será que, numa espécie de esperar para ver e para minimizar a crise, se vai deixar passar aquela que é talvez a última oportunidade para romper com a paralisia e a resignação? O tumulto que pode gerar um diálogo aberto, sem tabus, pode preocupar alguns, especialmente a escassos meses de uma visita papal. Mas a alternativa, o silêncio sepulcral que resultaria de uma aniquilação de todas as esperanças, não é aceitável.Como seria de esperar, esta tomada de posição suscitou (e certamente vai continuar a suscitar) reacções e comentários de sentido contraditório. No site La Bussola Quotidiana do italiano de Il Giornale, Andrea Tornielli, em "La protesta dei 143 teologi e la fede nell'Occidente secolarizzato" [número inicial de subscritores], pergunta se é em torno da disciplina do celibato ou da ordenação de mulheres que se centram hoje os problemas da Igreja Católica. Um outro jornalista, Vittorio Messori, interroga, no mesmo local, [Che noia le ideologie clericali] os professores de Teologia sobre se as matérias relativamente ás quais é proposta uma mudança de práticas não estão devidamente clarificadas, com os debates e a doutrina definidos desde os anos 60 até hoje.
Mas a Conferência dos Bispos da Alemanha mostra-se, aparentemente, menos contundente no desacordo e mais acolhedora dos argumentos e dos contributos dos subscritores do manifesto, segundo se pode concluir da comparação entre uma curta nota da agência Zenit e um trabalho publicado no Periodista Digital.
A escassos meses de uma nova visita de Bento XVI ao seu país natal - ele que também subscreveu, quando padre e teólogo jovem, um manifesto com alguns pontos comuns a este - as propostas dos teólogos não deixarão de animar os debates. Que não são certamente questões exclusivas da Igreja alemã.
1 comentário:
O texto em causa parece-me muito interessante. Mas não apresenta a polarização que os media têm divulgado. Apenas duas notas.
Não fala da ordenação de mulheres, mas do acesso de mulheres aos ministérios (serviços) eclesiais. Cabem aqui, naturalmente, diversas interpretações.
Não fala da "aceitação de casamentos de pessoas do mesmo sexo". Fala da exigência de não excluir as pessoas que vivem em relação homossexual.
As nuances não são ingénuas nem irrelevantes.
Vítor Coutinho
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