terça-feira, 27 de agosto de 2013

“A poesia me salvará”. A mística de Adélia Prado

"Rezar com os Místicos" é a designação de uma iniciativa anual do Cepat/CJ-Cias, do Brasil, que teve no último sábado a edição correspondente a 2013,  centrada na poetisa Adélia Prado. Já por lá "passaram" nomes de místicos cristãos como São João da Cruz, Santo Inácio de Loyola, Santa Teresa de Ávila, entre outros. A reportagem é de Jonas Jorge da Silva e as foto de Ana Paula Abranoski, ambos da equipe do Cepat/CJ-Cias, e foi publicada na newsletter da Unisinos de ontem.
Neste último sábado, dia 24 de agosto, ousou-se partir da experiência de vida cristã da poetisa mineira Adélia Prado, com a assessoria da professora de teologia da PUC-Rio, Mônica Baptista Campos, que fez um estudo intitulado ““A poesia me salvará”. Mística e afeto para uma cristologia teopoética na obra de Adélia Prado”. A partir da contribuição da poetisa mineira, Campos apresentou e encantou a todos os participantes com a possibilidade de uma experiência sensível e aberta à vivência cristã no cotidiano do tempo presente.


A assessora enfatizou que em suas poesiasAdélia Prado consegue captar os pequenos detalhes, enxergando o fundamental nas coisas do cotidiano. Sua poesia é a expressão da beleza presente na vida. É por esse caminho que ela entende a Deus. Para ela, experiência mística e experiência poética são uma mesma realidade.

Adélia Prado retoma a dimensão do belo e do encantamento com a vida, perdida todas as vezes que no cristianismo houve um estreitamento do olhar para uma visão meramente racionalista e lógica do mundo. A mística na obra da poetisa é o inundar-se, sem querer decifrar, mas deixando-se envolver pelo mistério.
A poetisa escreve o que vive. Nunca optou pelo burburinho, abrindo mão do assédio daqueles que querem dissociá-la da complexidade que é a própria vida simples, elementar. Na experiência de um mosteiro, por exemplo, considera o porteiro e o cozinheiro aqueles com maiores possibilidades da vivência mística. “Deus está entre as panelas”, escreve a poetisa.


No mundo da apatia, para a poetisa sentir é fundamental. Essa sua sensibilidade é fruto de sua própria condição. Aquilo que escreve não nasce de uma intelectualidade esvaziada de vida. Ela é uma mulher comum. É mãe de cinco filhos, tem medo de viajar de avião, foge do glamour e preserva a cultura do interior. Além disso, foi professora, catequista e sempre apreciou uma boa liturgia. Portanto, os principais temas e aspectos da literatura de Adélia Prado são: a condição da mulher, a forte impregnação da religiosidade cristã e do cotidiano doméstico, familiar e social.

Para Adélia Prado, a poesia é uma possibilidade para qualquer pessoa. É como a graça, pode acontecer para qualquer um, porque a poesia é gratuita. Ela é inspiração divina. O caminho místico é o caminho do sentido. Deus é a principal poesia e a própria Criação é uma criação poética deDeus. “Poesia sois Vós, ó Deus. Eu busco vos servir”, escreve.


Nas obras “O pelicano” e “A faca no peito”, a professora Mônica Campos encontrou a cristologia de Adélia Prado. Nelas está presente uma mística da encarnação. Deusestá no mundo, não está fora. A transcendência mora, pousa nas coisas. Em sua poesia, Jonathan é o codinome paraJesus. Assim, a poetisa percebe a encarnação de Deus como uma experiência afetiva. Se em nossa tradição a experiência corporal foi muito recalcada, aqui, ela a resgata. A mística cristã é o encontro com a pessoa de Jesus, que possui um corpo.

Há em Adélia Prado uma contundente crítica à tentativa de eliminar a condição corporal do ser humano. Escreve: “Entre as pernas geramos e sobre isso se falará até o fim, sem que muitos entendam: erótico é a alma”. Desta forma, a poetisa não abre mão da dimensão da beleza de Jonathan (Jesus). O belo atrai, é força erótica e sedutora. A beleza gera alegria, gozo e prazer. Ama-se a Deus porque este amou primeiro. A poetisa resgata o valor da dimensão erótica da vida, sem contrapô-la à experiência cristã. Trata-se de uma força de atração, um desejo de união com o outro. Essa força gera vínculos de saudade. É uma fonte de ternura e Jesus Cristo, neste sentido, é a expressão do Deus afetivo, do Deus-conosco, que possui uma relação de intimidade com o ser humano.
Foi um sábado excepcional para todos os participantes. Ao longo do dia, a professora Mônica Campos dinamizou sua assessoria com a distribuição de “pílulas de poesia”, com espaço de interiorização e com a distribuição de poesia por todo o local do encontro. Um momento forte de encontro, sintonia e celebração da vida cristã.

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