Livro
Hoje mesmo, chegou às livrarias o livro Francisco – O Papa que põe
a Igreja a mexer, que recolhe
mais um conjunto de crónicas de Bento Domingues no Público.
Este quarto volume da antologia das crónicas está centrado na figura do Papa Francisco e no movimento de reforma da Igreja –
ou seja, há outros nomes e rostos que também aqui são referidos.
O livro está organizado em nove capítulos, cuja estrutura se apresenta no texto que serve de apresentação da obra. É esse texto que a seguir se reproduz, omitindo as notas de rodapé. O texto é da autoria de Maria Julieta Mendes
Dias e de mim próprio.
O frade que não acredita no Papa,
mas crê num mundo de irmãos
Acredita frei Bento Domingues no
Papa Francisco? A pergunta pode parecer absurda, mas foi o próprio que, em
Outubro e Novembro de 2014, escreveu duas crónicas com esse título: “Eu já não
acredito no Papa Francisco”.
Jogando com a ironia, como tão bem
sabe fazer, o nosso autor escreve, no segundo daqueles textos: “Não sou
católico por causa do Papa Francisco, cujo projecto e práticas me dão muita
alegria, não podendo dizer o mesmo de todos os que conheci, mas nunca poderei
esquecer a minha dívida a João XXIII.”
Nesta frase, Bento Domingues resume
algumas das suas ideias acerca deste tema: o centro da sua fé não é a figura do
Papa (é, antes, Jesus Cristo, como não se cansa de repetir a propósito dos mais
variados temas); está muito feliz com o programa e a prática de Francisco; e
tem uma dívida para com João XXIII, o Papa que, em 1959, convocou o Concílio
Vaticano II, outra grande inspiração para frei Bento, como se depreende também
da leitura de muitas destes textos e igualmente veremos mais adiante.
Desde o início, ficou claro para
Bento Domingues que a opção do nome de Francisco “encerra o seu programa”. A 29
de Junho de 2014, escrevia, justificando a escolha do ex-cardeal Bergoglio:
“Optou pelos pobres nas diferentes periferias do mundo: geográficas, sociais,
culturais e existenciais. Os seus gestos e as suas atitudes foram os seus
primeiros e mais eloquentes discursos”.
As alegrias de frei Bento com este
Papa começaram com a escolha do nome, mas também com outros factores. A 28 de
Julho de 2013, escrevia: “O Papa Francisco mostrou que a reforma central do
Vaticano tem de começar por gestos, atitudes, iniciativas, decisões que mostrem
o que é e deve ser a Igreja e o Papa. Nenhuma reforma burocrática pode
substituir as transformações da consciência de ser Igreja: um povo de mulheres
e homens que se vão descobrindo como membros de uma grande família, ao serviço
de toda a humanidade. Se o Papa não for o primeiro a testemunhar que este é o
caminho, será o primeiro a desviar as pessoas do caminho de Cristo.”
* * *
Também pelas razões que ficam
ditas e por outras que adiante ainda se explicarão, uma intuição se nos impôs
claramente, desde o início: na organização de uma antologia destes mais de 23
anos de crónicas de Bento Domingues no Público,
um dos volumes deveria ser dedicado ao movimento de mudança e renovação da
Igreja Católica. Se o Papa João XXIII e o Concílio Vaticano II por ele
convocado foram a inspiração marcante, nas últimas décadas, para muitas das
ideias que Bento Domingues defende, a renovação do catolicismo concretiza-se,
nos últimos três anos, nas reformas que o Papa Francisco veio claramente
impulsionar (através dos seus “gestos, atitudes, iniciativas, decisões”). Desde
a escolha do nome e o seu primeiro “boa noite” na varanda central da Basílica
de São Pedro até às decisões relativas à reorganização da Cúria, à proposta de um
novo olhar sobre a realidade familiar, ao empenhamento na política ou ao
movimento mais largo de olhar para as periferias existenciais, culturais e
geográficas. E tudo isso é estudado, aprofundado e reflectido nas crónicas de
frei Bento.
Obviamente, este volume deve ser
lido em conjunto com os restantes já publicados: Um Mundo Que Falta Fazer, dedicado às implicações sociais e
políticas do cristianismo, na linha do que o Papa Francisco tem defendido; A Insurreição de Jesus, que mostra como
a pessoa de Jesus Cristo enquanto presença de Deus na humanidade é o centro da
reflexão de frei Bento; e O Bom Humor de
Deus e Outras Histórias, que propõe um caminho espiritual que cruza o humor
e a liberdade, a justiça e a misericórdia, tecendo e integrando “todos os fios
da vida”, como ele escrevia em 3 de Maio de 1992.
Neste conjunto de textos agora
aqui reunidos, aparece de forma evidente esse conceito de quem vai tecendo e
integrando todos os fios da vida, como um puzzle que se desvenda passo a passo,
à medida que se constrói. Esse processo – como é também evidente – exige
reflexão, discernimento, busca, tentativas de compreensão e de olhar a fundo
cada problema. E todas estas são características das crónicas e do método de
pesquisa de Bento Domingues.
Assim sendo, as primeiras crónicas
– escritas em 1992 ou, no caso destes volumes antológicos, em 1997 – podem reler-se
agora, à luz das últimas, mesmo se fazem referência, por vezes, a
acontecimentos ou pormenores datados. Do mesmo modo, as mais recentes ajudam a
iluminar e a confirmar muitas das intuições já presentes nos primeiros anos.
* * *
Faz sentido, neste momento,
recordar os critérios seguidos para a organização deste volume, semelhantes aos
já enunciados nos restantes. Deixámos de fora as crónicas publicadas entre 1992
e 1996, antes já reunidas em quatro volumes organizados cronologicamente. Considerando
as crónicas publicadas entre 1997 e a actualidade, seleccionámos quatro grandes
áreas temáticas: as três acima referidas, organizadas nos volumes já publicados,
e esta nova, centrada no tema da mudança da Igreja. Em cada volume, a partir do
assunto dominante ou central em cada crónica, agrupámos os textos por capítulos
para ajudar à organização da leitura. Dentro de cada capítulo, as crónicas
surgem por ordem cronológica.
Neste volume, tal critério permite
ainda aferir – como deixávamos entender antes – que Bento Domingues há muito defende
um conjunto de critérios para a mudança do catolicismo e que foram, em grande
parte, consubstanciados na intuição de João XXIII em convocar o Concílio
Vaticano II. Vários deles, no entanto, perderam-se pelo caminho ou ficaram de
novo submersos pela poeira dos séculos. Como muito bem diagnosticava frei Bento
a 11 de Junho de 2000, a Igreja Católica pensava, com o Vaticano II, “que tinha o relógio acertado
pelos sinais dos tempos”, quando “os tempos modernos entraram em crise
acelerada”. E acrescentava: “A Igreja ficou em dia com uma História que estava
a chegar ao fim. Ficaram ainda, por uns anos, abertas muitas frentes de luta,
mas já não havia qualquer desígnio credível a nível global que lhes pudesse dar
sentido.”
É por esse e muitos outros desajustamentos entretanto
surgidos que Bento Domingues defende, com frequência, que deveria ser convocado
um Concílio Vaticano III. É sua convicção, aliás, como exprimia a 1 de
Fevereiro de 2015, que há tantos e tais “problemas acumulados, em todos
os sectores da vida da Igreja que, ou muito [se engana] ou o Papa Francisco
anda a preparar, passo a passo, um Concílio Ecuménico, cuidando para que não
lhe aconteça o mesmo que ao Vaticano II”.
* * *
Estariam assim já plenamente
justificadas as razões para abrir este volume, dedicado às necessárias reformas
do catolicismo, com os textos mais dedicados à pessoa e à acção do Papa
Francisco. Desde o momento inicial da sua aparição à varanda de São Pedro foi
possível intuir o impulso renovador. A começar pela proximidade com que ele se
acerca das pessoas e que permitiu a frei Bento referir-se a ele como “um amigo
lá de casa”. Mas ele é, também, como refere em
outras crónicas, a incarnação de um novo humanismo, que passa por “ajudar a ver
que nada pode ser resolvido se não encararmos o mundo a partir dos excluídos,
seja qual for o género de exclusão”. E que é capaz de o fazer com a sua
prática, desse modo se tornando “uma profecia em acção”.
Essa profecia não surge por acaso.
Ao escrutinar a novidade que Francisco trouxe ao catolicismo deste início do
século XXI, Bento Domingues escreve: “Donde poderá vir a energia para tanta
desenvoltura reformadora? Do encontro com o núcleo essencial do Evangelho. É
este que dá sentido, beleza e fascínio ao novo estilo missionário, que faz a
triagem entre o principal e o secundário e vence essa obsessão de amontoar
doutrinas desconexas impostas à força de insistir no ridículo.”
Um tal impulso reformador não se
deve apenas a um homem só, nem é de agora – e essa é a fundamentação do segundo
capítulo, onde se referenciam um conjunto de “rostos, ideias e inspirações para
a mudança”. Às vezes com ternura, outras com ironia, outras com poesia e sempre
com uma relação profunda com o espírito do Evangelho e a reflexão teológica,
frei Bento vai evocando, ao longo dos anos, e das suas crónicas, nomes como
Nuno Teotónio Pereira, Sophia de Mello Breyner Andresen, Raul Solnado, D.
António Ferreira Gomes, António Alçada Baptista, Abel Varzim ou João Sá da
Costa. Ou outros como Madre Teresa de Calcutá, o cardeal Carlo Martini, o bispo
Óscar Romero, Jacques Loew e o movimento dos padres operários, o senador
norte-americano Edward Kennedy ou São Filipe Neri. O Evangelho tem rostos e,
para frei Bento, traduz-se sempre em muitos rostos.
Entre todas essas figuras,
destaca-se a do Papa João XXIII, que decidiu convocar um Concílio, contra tudo
e contra todos (leia-se: contra a vontade da Cúria Romana da época). Mas hoje,
como ficou dito, muitas das perspectivas conciliares – desde logo, a ideia da
renovação constante da Igreja, através da atenção permanente aos sinais dos
tempos – ficaram bloqueadas ou mitigadas. Por isso, frei Bento defende a
recuperação do espírito do Vaticano II e a convocação de um novo concílio ecuménico
e universal – é esse o centro da reflexão do terceiro capítulo.
Nessa secção, reunimos ainda
crónicas que se relacionam com algumas das questões não resolvidas pelo
Vaticano II e que, no entender de frei Bento Domingues, poderiam ser debatidas
num novo concílio: o papel das mulheres nos evangelhos e nas primeiras
comunidades cristãs e o lugar que hoje (não) ocupam na Igreja é uma delas. A proposta de um sínodo de
jovens, o papel da teologia e dos teólogos, novas correntes como a teologia da
libertação ou de movimentos como o Nós Somos Igreja são outras questões
tratadas neste capítulo.
Vale a pena reparar ainda que, tal como acontece em muitos
outros temas, Bento Domingues antecipa várias das intuições fundamentais do
Papa Francisco. Já notáramos isso na apresentação de O Mundo Que Falta Fazer, quando recordámos a ideia da atenção às
periferias, tão cara ao Papa Francisco: em Janeiro de 2001, frei Bento escrevia
que, depois de ter caído o muro de Berlim, era necessário “quebrar a redoma de
vidro dos privilegiados” e colocar “o centro na periferia”, porque tinha sido
na periferia que Deus estabelecera a sua tenda. Na crónica de 31 de Dezembro de
2000, O Cristianismo no limiar do III
milénio, escrevia, entretanto: “A primeira linguagem adequada à experiência
cristã primordial é a da prática, ou seja, a das esquecidas obras de
misericórdia.” Por alguma razão o Papa Francisco teve
a mesma intuição, ao proclamar um ano jubilar para a misericórdia. Bento Domingues
não faz mais, naquela afirmação, de confirmar o que sublinha o cardeal Walter
Kasper: a misericórdia é um conceito chave na Bíblia e na teologia cristã, mas
tem sido pouco aprofundado na reflexão teológica, o que deve ser considerado
“decepcionante ou mesmo catastrófico”. Mas a misericórdia, adianta ainda o
cardeal alemão, é o tema central do pontificado de Francisco, que
“reiteradamente afirma: a misericórdia de Deus é infinita, (...) Deus não
exclui nem abandona ninguém.”
* * *
Depois de um primeiro bloco sobre
o grande impulsionador do actual momento de renovação da Igreja – o Papa
Francisco – e as ideias e rostos que se têm destacado nesse processo, temos um
segundo conjunto de temas, dedicado a diversos
temas da mudança.
O primeiro deles é o que se
relaciona com a instituição católica e algumas das suas dinâmicas internas. Também
aqui, podemos verificar, no capítulo quarto, como, ao longo dos anos, Bento
Domingues foi antecipando várias das ideias e sugestões agora impulsionadas
pelo Papa: a insistência na necessidade da estética e da beleza na liturgia
(arte, música, arquitectura...) contra a “recessão litúrgica”, a importância da
tornar a Cúria Romana uma estrutura ao serviço das igrejas locais e não o
oposto, as ambiguidades e potencialidades da ideia da “nova evangelização” –
que deve começar dentro de casa.
O tema da misericórdia tem tido
uma concretização maior no tema central do quinto capítulo, a família. Com o
seu bom humor, escrevia Bento Domingues a 21 de Setembro de 2014: “O Papa
Francisco, que tem muita graça em receber a graça de Deus, resolveu, na
audiência geral do passado dia 10, propor que a Igreja, em todas as suas
expressões, seja uma escola da misericórdia. Não estávamos habituados. Era mais
associada a um ministério com tribunais lentos e sem piedade.”
Aborto e morte, sexualidade e
contracepção, integração de pessoas com deficiência e atenção aos mais velhos,
natalidade e apoio às famílias, testamento vital e bioética, ou o tema da
comunhão dos crentes que se divorciaram e voltaram a casar são algumas das
áreas que frei Bento trata nas crónicas reunidas neste capítulo.
“Contra a mentira no estado do
mundo” é uma das atitudes que leva Bento Domingues
a olhar com atenção para a realidade política, ambiental, social e económica,
recusando o fatalismo e a lógica do pensamento único ou da falta de
alternativas.
As crónicas deste capítulo devem ser lidas em conjunto com as que foram
reunidas no volume Um Mundo Que Falta
Fazer, já citado, todo ele dedicado às implicações sociais e políticas da
experiência cristã. Seguindo o rasto do Papa, observava frei Bento: “Para
o Papa Francisco, a solidariedade é uma reacção espontânea de quem reconhece a
função social da propriedade e o destino universal dos bens, como realidades
anteriores à propriedade privada. (...) Animados pelos seus Pastores, os
cristãos são chamados, em todo o lugar e circunstância, a ouvir o clamor dos
pobres. Isto não basta, diz Bergoglio: é preciso assegurar a educação, o acesso
aos cuidados de saúde e, especialmente, ao trabalho.”
Ao insistir nessa ideia do destino
universal dos bens da terra, Bento Domingues integra nessa lógica também o
próprio planeta, ameaçado no seu equilíbrio ecológico e ambiental. É o caso da
referência que faz à encíclica do Papa Laudato
Si’, com a qual o Papa pretende “aprofundar um debate em que todos possam
participar na salvação da casa comum”. E acrescenta: “Esta não é propriedade
privada de nenhuma geração e todas têm de pensar na herança que deixam aos seus
filhos. Somos, apenas, os gestores dessa herança. Seria um desastre ignorar
esta evidência.”
Surgem, enfim, dois capítulos
dedicados ao diálogo com a diferença, outra das prioridades do Papa Francisco.
Desde logo, com a diferença no interior do cristianismo, quando se fala das
Igrejas Ortodoxas, Protestantes, Anglicanas ou Evangélicas (Francisco foi,
recorde-se o primeiro Papa a encontrar-se com uma comunidade do protestantismo
evangélico, em Julho de 2014, em Caserta, no sul de Itália). A propósito da
forma como as diferentes igrejas e comunidades cristãs dialogam, frei Bento fazia
uma ironia cáustica: “Resultado:
esquece-se a falta que os outros nos fazem, para comungar em experiências que
nos poderiam provocar a descoberta de caminhos para a fé cristã, que nem
suspeitamos. A maioria dos cristãos nada sabe das outras tradições eclesiais, a
não ser os lugares-comuns de desconfiança mútua, transmitidos em casa ou nas
igrejas. A verdadeira falta de ecumenismo entre as igrejas cristãs é uma falta
de cristianismo e não apenas de inconvenientes a propósito de baptismos e
casamentos que se resolvem de forma mais ou menos burocrática.”
No outro lado desta moeda, está o diálogo inter-religioso e
cultural – incluindo, nesta dimensão, entre os que acreditam em Deus e os que
não professam qualquer fé religiosa, bem como a relação entre a fé e a ciência
ou a questão da laicidade. São aqui evocadas figuras como o Dalai Lama budista,
a mística judia Etty Hillesum, que morreu em Auschwitz e se abrira aos
evangelhos cristãos, ou ainda o teólogo católico Raimon Pannikar, de
ascendência hindu e cristã, que reconciliou em si diferentes tradições
espirituais e religiosas e fez da sua teologia uma reflexão sobre a pluralidade
da experiência de Deus.
O último capítulo é uma espécie de
evocação e homenagem. Em 2016, assinalam-se os 800 anos da criação, por
Domingos de Gusmão, da Ordem Dominicana. Ao longo dos anos, Bento Domingues foi
referenciando e estudando grandes nomes da história e da teologia dominicana,
como Tomás de Aquino (que foi transformado de “incendiário em bombeiro”, expressão
de Umberto Eco que frei Bento gosta de recordar), Bartolomeu de las Casas,
Antonio Montesinos, Dominique Chenu, Yves Congar, Edward Schillebeeckx ou Christian
Duquoc. Mas também vários dominicanos portugueses, como Bartolomeu dos
Mártires, João Domingos, Raul Rolo, Francolino Gonçalves ou José Augusto
Mourão. Na crónica Os dominicanos em
Portugal e o Vaticano II, faz mesmo uma referência circunstanciada ao papel
que a Ordem teve na divulgação do Concílio no país e na promoção da reflexão
sobre os documentos, em ordem à renovação da Igreja. São, também estes nomes e
factos, rostos e iniciativas na linha da mudança de que neste volume se trata.
Este capítulo surge assim, também,
como forma de exprimir igualmente a frei Bento Domingues a nossa gratidão pelo
seu papel na construção de um catolicismo, de um cristianismo e de um país mais
informados, mais justos e mais solidários. Ao evocar o seu confrade teólogo
belga Edward Schillebeeckx, frei Bento escrevia, em Janeiro de 2010, quase num
auto-retrato: “Enquanto crente, sou racional, procuro argumentos racionais e
sinto-me, assim, um crente cem por cento. Não há contradição. Ser crente não
significa ser irracional. A fé é a confissão de um homem racional. A
racionalidade da fé deve ser sempre desenvolvida e clarificada. Toda a minha
teologia é teologia de um crente: Fides
quaerens intellectum. A razão humana deve viver à vontade no domínio da fé.
Apelar para a obediência e fechar os olhos não é cristão, não é católico.
Precisamos de ser crentes racionais. S. Tomás é santo na sua racionalidade. Usa
a razão para abordar a fé. A racionalidade é cada vez mais necessária,
sobretudo, para reagir contra o fundamentalismo que também mina, cada vez mais,
as Igrejas. O fundamentalismo, presente em certas comunidades cristãs, leva ao
obscurantismo. É um grande perigo porque nega a razão humana.”
* * *
Nestes quatro volumes antológicos
de uma obra ímpar na comunicação social e na sociedade portuguesa, tentámos perscrutar
alguns aspectos essenciais de um pensamento irrequieto. Bento Domingues está em
permanente questionamento de si mesmo, da Ordem e da Igreja em que decidiu
servir, da sociedade em que vive. O seu horizonte é vasto, porque vasto é o
mundo. Nada melhor, por isso, do que evocar ainda palavras suas: “Nem [o Papa]
nem os outros cristãos podem esquecer o que aconteceu nas relações dos
discípulos com o Mestre e os principais obstáculos que Jesus teve de vencer,
para que eles pudessem entender o seu projecto: só há reino de Deus quando os
seres humanos se forem tornando e sentindo cada vez mais irmãos, esboço do
mundo como família de Deus.”
O horizonte de frei Bento é o
esboço de um mundo como família de Deus.
28 de Janeiro de 2016
Festa litúrgica de São Tomás de
Aquino
1 comentário:
Parabéns à Irmã Julieta e ao António Marujo.
É um belo texto: rigoroso, justo com a obra e "carinhoso" com o autor. Tudo muito merecido! Obrigada por tudo isso.
Depois de ler ainda fiquei com mais pena de não poder estar no lançamento (estamos fora de Portugal). Deve ser uma bela sessão.
Um abraço a ambos,
Lisete Fradique
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