terça-feira, 12 de novembro de 2013

O Novo Testamento de Jesus Cristo Segundo João, narrado por Luis Miguel Cintra



O Novo Testamento de Jesus Cristo Segundo João é o título do filme de Joaquim Pinto e Nuno Leonel no qual o actor Luis Miguel Cintra narra o texto do Evangelho de João, segundo a tradução da Vulgata latina, por António Pereira de Figueiredo (1725-1797). O filme será apresentado em Roma, nesta quarta-feira, 13, em competição, na secção CinemaXXI, do Festivale Internazionale del Film di Roma.
Depois da apresentação do filme, haverá um debate que conta com a participação de Virgilio Fantuzzi, padre jesuíta e crítico de cinema, que foi amigo e acompanhou várias rodagens do Pasolini e Fellini.
Não é a primeira vez que Luis Miguel Cintra faz uma experiência deste género. O actor gravou já, em disco (ed. Presente), um Sermão de Quarta-Feira de Cinzas, do padre António Vieira, e o Apocalipse de São João
Cintra leu também em público o sermão de frei António de Montesinos, o dominicano que primeiro criticou a colonização espanhola na América Central. E fez ainda leituras do Cântico dos Cânticosda Carta a Filémondo Eclesiastesalém das quatro narrativas da Paixão: São MateusSão MarcosSão LucasSão João
Agora, é a primeira vez que Cintra sai do espaço fechado para o campo, ao ar livre.
“O primeiro capítulo é acompanhado por imagens do local, seguindo-se um bloco em que somos imersos no ‘grão da voz’ de Luis Miguel”, explicam os realizadores. “A partir daí, a essa voz materializa-se na expressão, no gesto, na presença, no ritmo, na respiração, na pulsão do corpo do actor, que se transforma em veículo da materialização do texto.”
O filme fixa esse “dia de leitura, efectuada em continuidade desde o início da tarde até ao pôr do sol”. Acrescentam Joaquim Pinto e Nuno Leonel: “A interpretação inspirada permite vislumbrar, através de todos os séculos de fixações, transcrições e traduções de um texto que é já uma condensação em camadas sucessivas de uma experiência pessoal de Jesus, a emanação da força espiritual da vida de Cristo.”
Sobre aquela tarde de leitura e filmagem, escreve Luis Miguel Cintra:
Há alguma coisa que me transmite uma enorme alegria de viver no contacto, no trabalho com o Joaquim e o Nuno: a inabalável confiança na realidade, na sua transcendência. Por outras palavras que é isto senão amor à vida? Parece que me estão sempre a mostrar que só é preciso não nos deixarmos ficar surdos, cegos. O cinema com eles só difere da vida porque usam duas máquinas. Apetece dizer que fazer cinema é usar uma máquina para gravar som e outra imagem. Ponto final. Estaremos sempre perante Deus, não vale a pena fingir. E grava-se, filma-se aquilo que é verdade, vale sempre a pena, se o que se passa se passa mesmo, sem batota. Aquilo que as circunstâncias nos permitiram viver. Parece tão simples como a vida. Mas depende do amor. Da capacidade de amar. De nos expormos, de não ter medo. E de gostarmos do que nos rodeia e dos que nos rodeiam.
O Evangelho de João é todo ele uma definição do amor. Tem-me acompanhado numa imensa ânsia de alternativa para uma sociedade hipócrita, uma organização política do mundo actual verdadeiramente assassina, para uma tardia educação filosófica que não me deixe triste quando perceber que vou morrer. A tarefa a que se dedicam o Joaquim e o Nuno é para mim uma exemplar militância política: mudar pelo exemplo a maneira de viver de toda a gente. E bastou não me deixarem parar, porem-me no meio do campo a dizer o Evangelho só com eles e dois amigos mais como parceiros, sentir que o sol se punha enquanto eu lia a narrativa das palavras que João deixou escrito que o Cristo que ele amava disse há dois mil e tal anos, para toda a fancaria artística deixar de me interessar. Eu só quero entender. E ter companhia. ‘Creio no Espírito Santo.’ E não quero perder a vida em compromissos.

O Novo Testamento de Jesus Cristo Segundo João
Imagem, Som e Montagem: Joaquim Pinto e Nuno Leonel
Com Luis Miguel Cintra
129 minutos