Crónicas
Cem Dias de
Francisco: a mudança a caminho é o título
da crónica de Anselmo Borges no DN de hoje. Escreve o autor, sobre estes
primeiros tempos do novo Papa:
E a
revolução está em marcha. De modo natural, de tal modo natural que se fica
espantado por ser notícia precisamente o que não devia sê-lo. Por exemplo,
desejar "boa noite", "bom descanso", "bom almoço"
ao povo. O Papa tornou-se humano, vendo-se claramente que o seu desejo e
preocupação é o bem-estar, a saúde, a alegria de todos.
Reside
na Casa de Santa Marta, rejeitando o Palácio Apostólico, para evitar a solidão
e ter uma vida sadia no meio de gente. Um gesto de profundíssimo significado. (...)
Acentua permanentemente o amor de Deus e o seu perdão. Quer uma Igreja "de
portas abertas" e não "controladores da fé". "A crise é o
resultado do capitalismo selvagem", que impôs "a lógica do lucro a
qualquer preço, sem atender às pessoas". Critica as máfias que exploram as
pessoas e as reduzem à "escravatura". Previne os eclesiásticos contra
"o carreirismo".
O texto completo pode ser lido aqui.
A propósito da liturgia deste domingo, Vítor
Gonçalves faz também uma alusão aos primeiros cem dias do Papa Francisco. Fica
aqui a sua crónica:
À procura da Palavra - “Como
cordeiros...?”
(Domingo XIV do Tempo Comum, ano C)
”Ide: Eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos.” (Evangelho de Lucas 10, 13)
A linguagem
pastoril que Jesus tantas vezes utiliza tem uma clareza que certamente os
discípulos entenderam, mas não é isenta de ambiguidades. Se a imagem de
cordeiros aponta para uma missão pacífica no meio de um mundo agreste e
violento, é verdade que há também muito "lobo vestido de cordeiro". E
se isso pode significar simples falsidade (será assim tão simples?), quando o
"ser lobo" tem a ver com saque e rapina, com mais fortes que devoram
os mais fracos, não estamos longe de ver representados estes papéis na política
e na economia dos nossos tempos. Sem ir à dureza do provérbio latino de que
"o homem é lobo para os outros homens", sabemos como vivem em nós a
paz e a violência, o bem e o mal. Aquilo que alimentarmos dentro de nós acabará
por se manifestar na nossa vida.
A pedagogia
de Jesus é clara: o anúncio do Reino e o dom da paz realiza-se por uma presença
desarmada e pobre dos seus discípulos. Desarmada quer dizer de "mãos
vazias", em atitude de dar e receber, sem a "violência" que,
muitas vezes, a abundância de meios também revela. Porque é grande o perigo de
ir ao encontro de outros em atitude de conquista, com poderes e riquezas
julgados indispensáveis mas que acabam por ser obstáculo ao essencial cristão:
o encontro com Cristo e a vida transformada pelo seu amor. Não são os meios
para a evangelização importantes? Sim, se não se tornarem "fins", e
estiverem subordinados à essencial pobreza que Jesus propõe. Não é a riqueza,
quando se torna acumulação do quer que seja, uma das maiores violências?
Estes cento
e poucos dias do Papa Francisco têm sido uma constante interpelação para mim e
creio que para muitos. Quer pelos gestos simples mas decididos e coerentes (bem
dizia uma irmã sua após a eleição, mais ou menos por estas palavras: "se ele continuar a ser o mesmo, o Vaticano
vai ter muito trabalho com ele"), quer pelo "mini-magistério"
diário das suas missas na Casa de Santa Marta, onde mora, com palavras que
interpelam e pedem vida cristã renovada, o convite à pobreza e à autenticidade
são incontornáveis. Como condição para a verdadeira alegria, aquela de que
também fala Jesus no evangelho de hoje, "porque os vossos nomes estão inscritos no céu". É a alegria
dos pobres, dos que não usam a violência, dos que continuam a servir sem
procurar glória nem proveitos egoístas, dos que não se gastam em palavras mas
dão o corpo pela verdade. A verdade de Deus amar este mundo! É assim que somos
"cordeiros"?
(texto a
publicar no jornal Voz da Verdade de 07.07.2013; aqui podem ser lidas as anteriores crónicas, que não foram reproduzidas neste blogue)
(foto
reproduzida daqui)
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