(foto reproduzida daqui)
Marcelo
Barros, monge beneditino brasileiro e um dos nomes de topo daquilo que já se
pode chamar a eco-teologia, está em Portugal e intervirá, hoje e amanhã, em
mais dois debates – um no Porto, outro em Braga. Ontem, Marcelo Barros falou na
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, numa sessão que contou com a
participação de Paulo Borges, professor universitário e responsável da União
Budista Portuguesa.
O
debate de hoje no Porto decorre a partir das 17h, na Faculdade de Psicologia e
Ciências da Educação e conta também com a intervenção de Margarida Felgueiras,
professora da mesma faculdade, e Jorge Moreira, da Sociedade de Ética
Ambiental. Amanhã, quinta-feira, em Braga, a partir das 10h, a Sala de Actos do Instituto de
Ciências Sociais da Universidade do Munho (campus de Gualtar) recebe, além de
Marcelo Barros, dois professores universitários: Jacinto Rodrigues (Porto) e
José Pinheiro Neves (Minho). A vinda de Marcelo Barros a Portugal é a convite dos Missionários da Consolata.
Na
intervenção de Lisboa, Marcelo Barros referiu-se à “crise ecológica gravíssima” que vivemos e
que, pela primeira vez na história humana, “não é natural” e tem “custos
astronómicos”, pelas catástrofes ambientais que já provocou.
Neste
contexto, é necessária uma espiritualidade que reconcilie a pessoa humana com a
natureza, defendeu. Mas que abranja os diferentes âmbitos da vida, aliando a
ecologia ambiental à ecologia social. Marcelo Barros citou os números da
concentração de riqueza no mundo (metade está na posse de dois por cento de
pessoas) e dos milhares de crianças que morrem diariamente por fome, em
contraste com o milhão de toneladas de alimentos que se deita para o lixo,
diariamente para acentuar o paradoxo da situação actual.
As
espiritualidades indígenas, através das quais Marcelo Barros descobriu a
ecologia, podem ajudar-nos a descobrir que “não há separação entre natureza e
história, entre natureza e cultura”. A espiritualidade ecológica pode ser,
assim, um caminho de reconciliação e unidade.
Na
mesma perspectiva foi a intervenção de Paulo Borges que, partindo da visão
budista da questão, defendeu que “para proteger o equilíbrio ecológico da
terra, é necessária uma ecologia da mente, que proteja a mãe-terra” e para que
o futuro da humanidade “seja possível”.
O
mau entendimento do mandato bíblico – “enchei e dominai a terra” – pode ter
estado também na origem do uso desmedido das riquezas e recursos naturais,
acrescentou Marcelo Barros. O verbo hebraico usado nessa frase, no entanto, é o
mesmo do Salmo 8, mas que remete sobretudo para a noção de cuidado. Deturpado
esse conceito, o uso incontrolado dos bens da terra está agora a voltar-se
contra a pessoas, acrescentou o monge brasileiro.
É
necessário, por isso, mudar o paradigma, defendeu, referindo que isso passa
pela atitude concreta de cada pessoa, mas também por gestos como o do patriarca
ortodoxo Bartolomeu, que estabeleceu o primeiro domingo de Setembro como
celebração da criação.
Na
conclusão do seu livro O Céu e a Terra se
Casam, escreve Marcelo Barros:
“É
urgente fazer do cuidado espiritual com a natureza uma cultura, um estilo de
vida alternativo. Esse estilo de vida, como vimos, não consiste apenas em uma
simples mudança de costumes ou um modo de viver mais ligado à natureza. Isso é
importante, mas quando falamos em mudar o estilo de vida se trata de mais do
que isso. Diz respeito ao nosso modo de habitar o planeta, nosso modo de
trabalhar, de comprar, de consumir, de viajar. Se os relatórios dos organismos
internacionais nos dizem que a sociedade já se apropriou de 80% dos recursos
naturais do planeta e que isso tem consequências gravíssimas, precisamos de um
estilo de vida baseado na sobriedade e na mudança radical de nossos hábitos de
consumo. Em uma sociedade justamente baseada no consumismo voraz e acrítico,
este tipo de discurso parece absolutamente inútil e fadado a cair no vazio. Os
ricos consomem cada vez mais e os pobres, assim que podem, são também levados à
febre do consumo compulsivo.
Na
contramão desta onda, é preciso criar uma cultura crítica, hoje, desenvolvida
pelos grupos que trabalham o consumo crítico e consciente, o mercado équo
solidário e outras organizações de solidariedade. A defesa do planeta Terra e
da natureza exigem com urgência que possamos refazer uma espécie de
“humanização de nossos desejos”. Em 2001, o papa João Paulo II propôs uma
“conversão ecológica” que só pode ser profunda se tiver como base uma conversão
da cultura e uma verdadeira espiritualidade que nos faça ver a natureza e todo
o universo como sacramentos do amor divino. “
(O
livro O Amor Fecunda o Universo, de
Marcelo Barros e frei Betto, que trata também a questão da ecologia e
espiritualidade, está disponível para compra on-line, neste endereço)
Sem comentários:
Enviar um comentário