Se
olharmos para as comunidades cristãs dos primeiros séculos, o que vemos? “A
prática caritativa não foi apenas uma novidade” em termos da sociedade e da
cultura do tempo, como também “influenciou decisivamente a evangelização”, como
afirmou Santiago Guijarro Oporto, biblista e professor na Universidade
Pontifícia de Salamanca, numa intervenção, esta manhã, no XXVIII Encontro da
Pastoral Social, que decorre em Fátima. A iniciativa termina esta quinta-feira,
com uma conferencia do cardeal Seán O’Malley, arcebispo de Boston.
Na
sua intervenção, Santiago Guijarro disse que “dar sem esperar nada em troca foi
uma originalidade do cristianismo”. No mundo antigo, a solidariedade funcionava
apenas para os membros da família ou do clã. “As diversas formas de ajuda
social não eram dirigidas preferentemente aos pobres; tinham, antes, por
objectivo enaltecer o prestígio do doador”, disse Santiago Guijarro.
Acrescentou
o biblista espanhol: “Só nas comunidades judaicas se tinham desenvolvido formas
de caridade que tinham em conta o pobre. Estas acções estavam inspiradas por
uma visão de Deus interessado pelos desvalidos.”
Os
primeiros cristãos e as casas de famílias onde se reuniam rompem com essa
lógica da solidariedade restrita ao clã e acolhem todos, independentemente da
sua origem. As próprias cartas de São Paulo são disso um testemunho,
acrescentou o biblista. No capítulo 12 da Carta aos Romanos, exemplificou, dos
serviços e funções descritos para a comunidade cristã, quatro deles referem-se
à caridade: o consolo, a distribuição dos bens materiais, o serviço e a prática
da misericórdia.
É
Tertuliano que, num dos seus textos, cita o exemplo da contribuição mensal que
os cristãos recolhiam entre si, para poder ajudar os que mais necessitavam. E
acorriam “a todos”, sinal de que a comunidade “funcionava como tal”. A prática
da caridade era mesmo “mais determinante que a mensagem”.
“Sim,
o cristianismo inaugurou um mundo novo”, disse Santiago Guijarro. “Exercendo a
caridade, uma comunidade cristã diz a si mesma quem é”. Mas isso deve ser feito
chegando a “novas formas de pobreza” como os imigrantes ou os deficientes.
Num
dos painéis do encontro, a irmã Júlia Barroso, presidente da Comissão de Apoio
às Vítimas do Tráfico de Pessoas, referiu o exemplo desta “escravatura do
século XXI”, como já lhe chamou o Papa Francisco. Isabel Cordovil, animadora de
um Grupo de Inter-Ajuda Social, da Cáritas, falou da importância de contrariar
o “isolamento, a solidão e a frustração” dos desempregados. O padre João
Gonçalves, coordenador nacional da
Pastoral Penitenciária, insistiu na ideia de que o trabalho com os presos é
“urgente” diz respeito a todos os crentes. “Se um cristão está preso, a Igreja
está lá, porque Jesus Cristo dizia ‘eu estive preso e foste visitar-me’”.
Num
outro painel, o psiquiatra Pedro Macedo, presidente da associação
ProfundaMente, referiu que é possível chegar mesmo às pessoas debilitadas nas
suas capacidades cognitivas. “Queremos conseguir dar sentido à vida das pessoas”,
afirmou.
Hélder
Afonso, da Cáritas de Vila Real, sublinhou a importância de trabalhar “com os
pobres e não pelos pobres”, enquanto o padre de origem argentina Luís Maurício
Guevara disse que se deve ir ao encontro dos que são “flagelados pela pobreza”.
E citou o exemplo do trabalho dos Missionários da Consolata no bairro do
Zambujal, na Amadora, em que tem sido possível colocar várias etnias a
conhecerem-se e a partilhar as diferentes culturas.
(Na
agência Ecclesia, pode ler-se também uma entrevista ao presidente da Comissão Episcopal de Pastoral Social, D. Jorge Ortiga, sobre o compromisso social que a
fé cristã exige)
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