quarta-feira, 11 de setembro de 2013

E do início, pode vir alguma coisa de bom?

Se olharmos para as comunidades cristãs dos primeiros séculos, o que vemos? “A prática caritativa não foi apenas uma novidade” em termos da sociedade e da cultura do tempo, como também “influenciou decisivamente a evangelização”, como afirmou Santiago Guijarro Oporto, biblista e professor na Universidade Pontifícia de Salamanca, numa intervenção, esta manhã, no XXVIII Encontro da Pastoral Social, que decorre em Fátima. A iniciativa termina esta quinta-feira, com uma conferencia do cardeal Seán O’Malley, arcebispo de Boston.
Na sua intervenção, Santiago Guijarro disse que “dar sem esperar nada em troca foi uma originalidade do cristianismo”. No mundo antigo, a solidariedade funcionava apenas para os membros da família ou do clã. “As diversas formas de ajuda social não eram dirigidas preferentemente aos pobres; tinham, antes, por objectivo enaltecer o prestígio do doador”, disse Santiago Guijarro.
Acrescentou o biblista espanhol: “Só nas comunidades judaicas se tinham desenvolvido formas de caridade que tinham em conta o pobre. Estas acções estavam inspiradas por uma visão de Deus interessado pelos desvalidos.”
Os primeiros cristãos e as casas de famílias onde se reuniam rompem com essa lógica da solidariedade restrita ao clã e acolhem todos, independentemente da sua origem. As próprias cartas de São Paulo são disso um testemunho, acrescentou o biblista. No capítulo 12 da Carta aos Romanos, exemplificou, dos serviços e funções descritos para a comunidade cristã, quatro deles referem-se à caridade: o consolo, a distribuição dos bens materiais, o serviço e a prática da misericórdia.

É Tertuliano que, num dos seus textos, cita o exemplo da contribuição mensal que os cristãos recolhiam entre si, para poder ajudar os que mais necessitavam. E acorriam “a todos”, sinal de que a comunidade “funcionava como tal”. A prática da caridade era mesmo “mais determinante que a mensagem”.
“Sim, o cristianismo inaugurou um mundo novo”, disse Santiago Guijarro. “Exercendo a caridade, uma comunidade cristã diz a si mesma quem é”. Mas isso deve ser feito chegando a “novas formas de pobreza” como os imigrantes ou os deficientes.
Num dos painéis do encontro, a irmã Júlia Barroso, presidente da Comissão de Apoio às Vítimas do Tráfico de Pessoas, referiu o exemplo desta “escravatura do século XXI”, como já lhe chamou o Papa Francisco. Isabel Cordovil, animadora de um Grupo de Inter-Ajuda Social, da Cáritas, falou da importância de contrariar o “isolamento, a solidão e a frustração” dos desempregados. O padre João Gonçalves,  coordenador nacional da Pastoral Penitenciária, insistiu na ideia de que o trabalho com os presos é “urgente” diz respeito a todos os crentes. “Se um cristão está preso, a Igreja está lá, porque Jesus Cristo dizia ‘eu estive preso e foste visitar-me’”.
Num outro painel, o psiquiatra Pedro Macedo, presidente da associação ProfundaMente, referiu que é possível chegar mesmo às pessoas debilitadas nas suas capacidades cognitivas. “Queremos conseguir dar sentido à vida das pessoas”, afirmou.
Hélder Afonso, da Cáritas de Vila Real, sublinhou a importância de trabalhar “com os pobres e não pelos pobres”, enquanto o padre de origem argentina Luís Maurício Guevara disse que se deve ir ao encontro dos que são “flagelados pela pobreza”. E citou o exemplo do trabalho dos Missionários da Consolata no bairro do Zambujal, na Amadora, em que tem sido possível colocar várias etnias a conhecerem-se e a partilhar as diferentes culturas.

(Na agência Ecclesia, pode ler-se também uma entrevista ao presidente da Comissão Episcopal de Pastoral Social, D. Jorge Ortiga, sobre o compromisso social que a fé cristã exige)



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