No próximo sábado, a partir das
15h30, a Igreja Evangélica Presbiteriana de Lisboa (IEPL) assinala o seu 147º
aniversário, com um programa que inclui cinema, feira de livros e vídeos, um
debate e culto litúrgico. A iniciativa decorre nas instalações da IEPL (Rua
Tomás da Anunciação, 56 D, próximo do Jardim da Parada, no bairro de Campo de
Ourique).
Sábado, a celebração começa com uma
exposição e venda de livros e vídeos. Às 16h, é apresentado o filme Madeirenses Errantes, com base no livro
do jornalista Ferreira Fernandes com o mesmo título. Logo após a projecção do
filme, haverá um debate com o autor do livro, onde se descreva a saga do
nascimento da primeira Igreja Reformada em território português, animada por
Robert Kalley, um médico escocês que trabalhava na Madeira. Esse grupo de
primeiros crentes evangélicos em Portugal acabou a ser perseguido e obrigado ao
exílio, acabando por se distribuir por vários pontos do mundo – nomeadamente em
Trinidad & Tobago,
estado do Illinois, nos Estados Unidos e Hawai.
Robert Kalley
Domingo, há três momentos: um
fórum sobre a história da IEPL (10h), um culto de acção de graças em que será
orador o bispo da Igreja Metodista, José Sifredo (11h), e um almoço comunitário
(13h).
O livro e, depois, o documentário
da RTP nasceu do contacto com os descendentes dos madeirenses errantes, das
suas memórias e da memória de alguns nomes ou palavras de português que por
vezes ainda se descobrem.
Em 24 de Janeiro publiquei no
Público um texto sobre esta história, que reproduzo a seguir (omitindo apenas
pequenas referências de actualidade):
Foi conhecido como o santo dos
pobres ou o bom doutor inglês. Montou escolas e um hospital no Funchal. Foi
depois perseguido, preso e obrigado a sair da Madeira – tal como aconteceu a
pelo menos dois mil madeirenses que tinham abraçado a fé protestante. O médico
Robert Reid Kalley, que, entre 1838 e 1846, viveu na ilha, foi o fundador da
Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal (IEPP) e incansável divulgador da
Bíblia. A memória das perseguições aos “hereges calvinistas” [está num] livro
há muito esgotado, que conta a história deste evangelizador intrépido [e que] acaba
de ser reeditado pela IEPP. Robert Reid
Kalley – O Apóstolo da Madeira foi escrito por Michael P. Testa, um outro
pastor presbiteriano, este de origem americana, que trabalhou em Portugal entre
1949 e 1964. Uma história desenvolvida no livro Madeirenses Errantes (ed. Oficina do Livro), do jornalista Ferreira
Fernandes.
David Valente, secretário-geral da
IEPP, recorda que a perseguição aos madeirenses protestantes foi uma das duas
maiores do século XIX, a par de uma outra em Madagáscar. E, mesmo em tempos de
diálogo ecuménico, (...) David Valente diz que “é preciso conhecer estas
histórias para saber o que aconteceu e evitar que volte a acontecer”.
Nascido em 8 de Setembro de 1809,
nos arredores de Glasgow, a alma racionalista do jovem Kalley não quis seguir
os desejos do padrasto e do avô, que o desejavam para ministro da Igreja da
Escócia. Por isso opta pela Medicina, licenciando-se em 1829.
Com 20 anos, oferece-se como médico de bordo nos navios que faziam a viagem até
Bombaim. Já estabelecido como médico, o acompanhamento de uma doente muda-lhe a
vida: “Senti, satisfeito, que há um Deus, que este livro [a Bíblia] é de
Deus...”, dirá ele mais tarde. Kalley deseja partir como médico e missionário
para a China. A mulher com quem entretanto casara era tísica e ele decidiu
levá-la uns tempos para a Madeira, com a ideia de que ela se curasse. Chegaram
ao Funchal a 12 de Outubro de 1838.
Kalley usa esforços e fortuna “a
favor do povo pobre e analfabeto da ilha”, escreve Testa. Estuda Português, faz
exame para exercer Medicina em Portugal e aprofunda estudos teológicos. Em
1840, monta um hospital com 12 camas, oferecendo tratamentos e internamento
gratuitos. Monta uma rede de escolas, às quais fornece material e professores,
frequentadas por “centenas de homens, após os trabalhos duros nos campos”, como
o próprio descreve.
Ao mesmo tempo, Kalley distribuía
exemplares da Bíblia, esclarecia dúvidas, compunha hinos religiosos em português.
As suas actividades proselitistas começam a merecer a desconfiança das
autoridades políticas e religiosas. O bispo católico, que se contava entre os
clientes e amigos, comunica-lhe o teor de uma carta de Lisboa, recomendando o
fim de tal apostolado. Kalley não desiste.
O médico enfrenta dificuldades.
Burocracia, ameaças, tudo serve para apertar o cerco, dirigido sobretudo por um
cónego católico – Carlos Teles de Meneses. O escândalo, nota Ferreira Fernandes,
“atinge o ponto de não retorno quando, no início de 1843, dois madeirenses se
convertem publicamente”: Nicolau Tolentino Vieira e Francisco Pires
Soares.
Kalley é preso durante seis meses. Maria Joaquina Alves, mãe de sete filhos, é
também detida, mas por dois anos e meio.
No Outono de 1845, crescem a
violência e os insultos. A 8 e 9 de Agosto seguinte, soldados e cúmplices
expulsam os “calvinistas hereges” das suas casas, obrigando-os a fugir para os
campos e a montanha. Sobrevivem escondidos.
Kalley foge nesse dia a bordo do Forth, aportado na baía do Funchal. No
dia 23, o William leva pelo menos 200
refugiados fugidos à perseguição religiosa. Nos dois anos seguintes, um total
de dois mil madeirenses irá para Trindade, Antígua, Jamaica, Illinois, Havai.
Depois de passar por Malta e Palestina, Kalley chega ao Brasil em 1855, onde
funda a Igreja Presbiteriana. Regressa à Escócia em 1876, após uma vida
dedicada à causa que abraçara.
Texto anterior no blogue
Fixemos bem este rosto. Será ele o de um terrorista?
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1 comentário:
Olá, parabens pelo blog. Mas, algumas informações estão incorretas. Kalley era da Igreja Livre da Escócia, e em Portugal, não fundou nenhuma denominação. O primeiro ministro que foi ajuda-lo na Madeira era da Igreja da Escocia foi sem seu conhecimento. Os crentes madeirenses foram perseguidos e o movimento de Kalley se desfez com sua perseguição e expulsao da Ilha. A Igreja Presbiteriana assumiu o restante e daí vem sua historia. No Brasil Kalley não fundou a Igreja Presbiteriana, mas a Igreja Congregacional.
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