A irmã Teresa Kotturan (à esquerda), da Federação das Irmãs da Caridade nas Nações Unidas,
com Shanti Choudhary. Através do apoio de cooperativas fundadas com a ajuda das Irmãs no Nepal, Shanti Choudhary expandiu uma plantação de vegetais,
o que lhe permitiu encontrar possibilidades de viver dignamente.
(Foto de Malini Manjoly/Irmãs da Caridade de Nazaré, reproduzida daqui)
Foram muitos os textos
publicados a propósito do Dia Internacional da Mulher, que ontem, dia 8 de
Março, se assinalou, incluindo sobre a questão do papel das mulheres no
interior das religiões – e, em especial, do catolicismo.
Na página da
Unisinos, pode ler-se já, em português, a reportagem de Marie-Lucile Kubacki,
publicada na revista mensal Donne Chiesa
Mondo (Mulheres Igreja Mundo), do jornal L’Osservatore Romano. A reportagem
fala dos casso em que muitas religiosas são reduzidas à condição de funcionárias
não remuneradas em instituições eclesiásticas ou casas de clérigos. Como a irmã
Marie pergunta, na reportagem: “Um eclesiástico pensa que a irmã deva lhe
servir a refeição e ficar comendo sozinha na cozinha depois de servi-lo? É
normal que uma pessoa consagrada seja servida dessa forma por outra consagrada?
E sabendo que as pessoas consagradas destinadas aos serviços domésticos são
quase sempre mulheres, religiosas? A nossa consagração não é igual à
deles?". (O texto pode ser lido aqui)
Como se assinalava
em texto anterior deste blogue, está a crescer o
debate sobre o papel das mulheres no interior das comunidades cristãs. No Crux, Claire Giangravè escreve que há
sinais de “um ponto de viragem” mesmo no interior do catolicismo, sugeridos
pela realização de conferências, debates, reuniões e tratamento do tema em
meios de comunicação da própria Igreja.
O texto refere a
conferência Vozes da Fé, que esta semana decorre em Roma, onde se ouviu que a
Igreja Católica está numa “encruzilhada muito importante” ou, mesmo, a
atravessar uma “revolução cultural interna”. “Hoje, a Igreja enfrenta cada vez mais o zelo
feminista recém-descoberto no movimento #metoo em todo o mundo, mas também
mudanças profundas de dentro”, acrescenta a articulista, num texto que pode ser
lido aqui em inglês.
Num outro texto do
mesmo jornal digital, John Allen analisa vários contributos na conferência
Vozes da Fé, para afirmar que muitas participantes tentam reorientar as
estratégias do debate para lá da questão do acesso ao ministério ordenado. “Talvez seja
necessário concentrar-se menos no que a Igreja diz ‘não’ e mais sobre aquilo
que ele está preparada para dizer ‘sim’, resume o articulista. Na conferência,
relata, seis mulheres de diferentes partes do mundo passaram cerca de uma hora
sem nunca pronunciar a palavra "sacerdote" – e sem fazer uma alusão
indirecta ao debate sobre o sacerdócio. Apesar de, na sua maioria, apoiarem
essa reivindicação, consideram que a estratégia deve ser outra, como se pode
conferir aqui, no texto em inglês.
Pequenos sinais
desse movimento crescente são também o debate que ocorreu em Madrid, a
propósito da apresentação do livro Dez
Coisas que o Papa Francisco pede às Mulheres. Ou, ainda, o facto de
muitas mulheres crentes terem aderido ao movimento de greve no dia 8, como
também se refere nesta notícia, citando Silvia Martínez Cano, católica,
presidente da Associação de Teólogas Espanholas, e Amparo Sánchez, muçulmana, que dirige a Plataforma contra a
Islamofobia.
A teóloga espanhola
Isabel Gómez Acebo, autora de vários livros sobre teologia feminista e que
chegou a dirigir a colecção En Clave de Mujer (ed. Desclée
de Brouwer, 25 títulos publicados) escreve, a propósito do que ainda se passa no interior do
catolicismo: “Mas o mais assombroso é que a Igreja Católica, que tem como regra
a defesa dos sectores mais desfavorecidos, se mostre relutante em admitir as
mulheres nos órgãos de poder. Com isto perde prestígio e não pode defender a
palavra dos mais fracos porque os seus opositores lhe dizem que, antes de dar
conselhos, arrume a sua casa.”
(Em cima: foto da exposição Por vezes, vê-se. Dói sempre,
do fotógrafo David Gama, reproduzida daqui)
Tal como referi no texto já citado, a exegese e a investigação bíblica têm dado um contributo fundamental para o
avanço deste debate. Lucetta Scaraffia, directora da revista Donne Chiesa Mondo, explica, numa
entrevista à revista francesa Le Monde de la Bible, porque foi eliminado, ao longo de séculos e pouco a pouco, o
papel de apóstola de Maria Madalena, sobrepondo-lhe o rosto de pecadora arrependida.
“Escolher a imagem da pecadora arrependida permite ocultar a ligação de Jesus
às mulheres, de quem, ao contrário, Ele gostava muito. Mesmo aquelas com uma
vida ‘irregular’ são sempre muito importantes em todos os Evangelhos. Jesus vê
que as mulheres amam mais que os homens, que compreendem melhor do que os
homens o amor”, diz a historiadora, numa entrevista que pode ser lida aqui em português.
Na página da Eclesalia,
Manuel Bermúdez Trujillo escreve precisamente sobre Jesus e as mulheres: Jesus
“relacionava-se igualmente com impuras, viúvas, com posses, ricas, solteiras,
casadas, operárias, donas de casa ou pertencentes à corte real. Mulheres em
número importante, algumas conhecidas pelo seu nome ou procedência familiar e geográfica
foram as únicas do seu grupo que estiveram ao seu lado durante o seu processo,
tortura e execução. Mulheres, segundo os evangelistas, foram as que recebera,
em primeiro lugar a notícia do maior acontecimento depois da sua morte.” (texto aqui em castelhano)
Não foi só no tempo de Jesus que as mulheres foram
importantes na história do cristianismo. Gloria Riva recorda o nome de
Hildegarda de Bingen para dizer que fazem falta “pessoas assim: figuras
políticas, masculinas e femininas, figuras religiosas capazes de produzir
frutos constituídos por factos, não por palavras. Pessoas de escolhas corajosas
e contracorrente que voltem aos princípios fundadores de uma existência humana
digna desse nome e de uma política que ofereça ao cidadão a garantia da vida,
sã no corpo e na mente”. (texto para ler aqui na íntegra)
Pearl Drego, do movimento católico de mulheres Graal,
percorre também esse itinerário desde o tempo de Jesus até à actualidade, com
as chaves da bondade e da inteireza. E no Avvenire,
Luciano Moia debruça-se sobre o sonho do Papa Francisco em ter uma Igreja que,
além de pobre, seja também “esposa e mãe”.
Noutro registo, podem ler-se vários trabalhos do Global Sisters Report, que pretende dar
a conhecer o compromisso de religiosas católicas em âmbitos de actividade como
o ministério pastoral, espiritualidade, ambiente, igualdade, migrações ou
tráfico de mulheres e crianças. Num dos últimos textos, referia-se o papel que
várias congregações religiosas têm n a promoção de um desenvolvimento que
assente na erradicação da pobreza. (aqui, em inglês)
Foto da exposição Por vezes, vê-se. Dói sempre,
do fotógrafo David Gama, reproduzida daqui
Finalmente, não se pode esquecer as tristes realidades em que
vivem ainda tantas mulheres. Uma reportagem que vale a pena ler, a propósito de
uma exposição fotográfica que pretende retratar a violência contra as mulheres,
através das vozes de quem acolhe vítimas dessas situações, foi também ontem
publicada pela agência Ecclesia.
E, para recordar que, perante os problemas, deve e podem encontrar-se sempre estratégias de solução, António Guterres explica, neste texto que ontem
assinava no Público, como levou à ONU
o seu compromisso pessoal por mudar a situação de discriminação a que as mulheres
também têm estado sujeitas, mesmo em organizações internacionais. Para ler aqui.
(o texto anterior neste blogue apresenta alguns discos tocados e cantados por mulheres)
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