quarta-feira, 29 de maio de 2013

No meio da crise


José Antonio Pagola

A crise económica vai ser longa e dura. Não nos enganemos. Não poderemos olhar para o outro lado. À nossa volta, mais ou menos próximo, iremos encontrando famílias obrigadas a viver da caridade, pessoas ameaçadas de despejo, vizinhos atingidos pelo desemprego, doentes sem saber como resolver os seus problemas de saúde ou medicação.

Ninguém sabe muito bem como irá reagir a sociedade. Sem dúvida, irá crescendo a impotência, a raiva e a desmoralização de muitos. É previsível que aumentem os conflitos e a delinquência. É fácil que cresça o egoísmo e a obsessão pela própria segurança.

Mas também é possível que vá crescendo a solidariedade. A crise pode-nos fazer mais humanos. Pode ensinar-nos a partilhar mais o que temos e aquilo de que necessitamos. Podem-se estreitar os laços e a ajuda mútua dentro das famílias. Pode crescer a nossa sensibilidade para com os mais necessitados. Seremos mais pobres, mas podemos ser mais humanos.

No meio da crise, também as nossas comunidades cristãs podem crescer em amor fraterno. É o momento de descobrir que não é possível seguir Jesus e colaborar no projeto humanizador do Pai sem trabalhar por uma sociedade mais justa e menos corrupta, mais solidária e menos egoísta, mais responsável e menos frívola e consumista.

É também o momento de recuperar a força humanizadora que se encerra na eucaristia quando é vivida como uma experiência de amor confessado e partilhado. O encontro dos cristãos, reunidos cada domingo em torno de Jesus, há-de converter-se em lugar de consciencialização e de impulso de solidariedade prática.

A crise pode sacudir a nossa rotina e mediocridade. Não podemos comungar com Cristo na intimidade do nosso coração sem comungar com os irmãos que sofrem. Não podemos partilhar o pão eucarístico ignorando a fome de milhões de seres humanos privados de pão e de justiça. É uma burla darmos a paz uns aos outros esquecendo os que vão ficando excluídos socialmente.

A celebração da eucaristia vai ajudar-nos a abrir os olhos para descobrir a quem temos de defender, apoiar e ajudar neste momento. Há de despertar-nos da “ilusão da inocência” que nos permite viver tranquilos, movendo-nos e lutando apenas quando vemos em perigo os nossos interesses. Vivida cada domingo com fé, pode fazer-nos mais humanos e melhores seguidores de Jesus. Pode ajudar-nos a viver a crise com lucidez cristã, sem perder a dignidade nem a esperança.

Distribuição: EcleSALia; apoio na tradução: Antonio Manuel Álvarez Pérez

Sem comentários: