sexta-feira, 28 de julho de 2017

O sétimo filho da leprosa e o poder como serviço


O padre Anastácio Jorge em Moçambique

“Para mim não há poder, há serviço”, repete o padre Anastácio Jorge, membro da Sociedade Missionária da Boa Nova, a trabalhar em Moçambique há 30 anos. Nascido no hospital Rovisco Pais (Tocha), em 1959, como o sétimo filho de mãe leprosa, Anastácio cresceu vendo a sua mãe através de um vidro, como numa prisão, sem que ela pudesse tocar-lhe.  
“O poder mata e corrompe”, insiste, nesta entrevista dada há dias ao jornalista Manuel Vilas Boas, da TSF. E por isso o missionário português avisa que a Igreja “não pode manter um sistema de pobreza com a promoção” de uma caridade limitada ao socorro, que não liberta nem dá dignidade ou rosto às pessoas. “Esta coisa de as pessoas todos os dias baterem à porta para pedir pão, não é bom...”, diz. E a igreja deveria estar “ao serviço da liberdade e das escolhas”.
A sua paixão, acrescenta, é anunciar Jesus, ouvir coisas novas, reaprender e ouvir os outros. Inquieto enquanto jovem, integrou a União de Estudantes Comunistas (UEC), após o 25 de Abril de 1974 e o tempo de esperança que a Revolução significou. Depois, desiludido, viveu uma experiência mística que o levou a entrar, com 21 anos, no Seminário das Missões de Valadares (Gaia). Depois do Porto e Roma, seguiu para Moçambique, onde foi ordenado padre em 1992.
Hoje, admirador confesso da acção do Papa Francisco, é pároco de Malavane e do Aeroporto, onde tem desenvolvido obras de promoção social, incluindo dirigidas a leprosos, e apoiado iniciativas de microcrédito, que considera uma “escola de valores”.
A entrevista pode ser ouvida aqui.


quinta-feira, 20 de julho de 2017

Fátima, 100 anos, de Maio a Outubro (2) – Como começou a história

Depois de Maio, podemos voltar a parte do muito que se publicou sobre Fátima e que ajudará a sistematizar informação e elementos para vários debates sobre o fenómeno, que importa agora aprofundar.
Neste mês, trago aqui dois textos publicados nas revistas JN História e Visão, onde tento resumir o que era Fátima há 100 anos e como se desenvolveu a história inicial do fenómeno. Este é o segundo trabalho da série iniciada aqui e que incluirá textos vários, nos dias 13 dos próximos meses, até Outubro.

DO LUGAR INÓSPITO AO CAIS DE CINCO MILHÕES

Era um lugar inóspito e agreste, de solo rochoso e de pouca vegetação. Ainda assim, crescem na região oliveiras, figueiras e azinheiras, por exemplo. A pouco mais de 120 quilómetros de Lisboa, há um século a distância era muito maior. Era aquela que separava um país muito pobre, analfabeto e com uma agricultura de subsistência, da capital urbana que começava a despontar para o desenvolvimento, a cultura e a política. Mais ainda: era também a distância entre o povo, predominantemente monárquico, e as elites da capital, maioritariamente aderentes da República, que tinha sido implantada em 1910.


A pequena Jacinta levada ao colo, a 13 de Outubro de 1917, 
na foto captada por Joshua Benoliel

A 13 de Maio de 1917, na Cova da Iria, um pequeno lugar da aldeia de Fátima, três crianças acompanhavam os rebanhos dos pais: Lúcia dos Santos, de 10 anos, e os primos Francisco Marto, com quase 9 anos, e Jacinta Marto, de 7. Contariam eles depois, interrogados pelo pároco local, que estavam sentados quando viram um relâmpago. “Levantaram-se e começaram a juntar as ovelhas para se irem embora com medo, depois viram outro relâmpago, depois viram uma mulher em cima duma carrasqueira, vestida de branco...”
Lúcia falou com a visão (a prima Jacinta viu e ouviu mas não falou, o primo Francisco só viu), que lhe teria dito para voltarem ao mesmo local todos os meses, até Outubro. Lúcia ainda perguntou se a guerra duraria muito – o mundo estava mergulhado na I Grande Guerra, mas a resposta a essa pergunta só viria em Outubro: a guerra acabaria nesse mesmo dia, contaram as crianças, numa versão que mais tarde seria corrigida.
O fenómeno de Fátima acabaria por ter Lúcia como protagonista principal. Ela recebia “uma mensagem especial”, como dizia o padre Joaquin Maria Alonso, que mais tarde viria a ser um dos mais importantes investigadores dos documentos e do processo de Fátima.

terça-feira, 4 de julho de 2017

Morreu o sociólogo da religião Peter L. Berger

Peter L. Berger, um dos teorizadores da secularização e co-autor, com Th. Luckman, daquele que foi considerado o 5º mais influente livro de sociologia do século XX - 2A Construção Social da Realidade", morreu no passado dia 27 de junho, com 88 anos. Foi ainda autor de obras como "Um Rumor de Anjos: a Sociedade Moderna e a Redescoberta do Sobrenatural" e "O Dossel Sagrado: Elementos para uma Teoria Sociológica da Religião". O texto que segue foi publicado na Christianity Today,  no passado dia 29 e traduzido por Isaque Gomes Correa e publicado na Newsletter do Instituto Humanitas da Unisinos .

"A Universidade de Boston informou o falecimento esta semana do professor emérito de 88 anos Peter Berger, fundador, em 1985, do Instituto para a Cultura, Religião e Assuntos Mundiais da citada universidade e que o levou a ser a principal fonte de estudos sobre “a religião em uma era de globalização”.
Al Mohler, presidente do Southern Baptist Theological Seminary, em Kentucky, enalteceu Berger como “talvez o pensador social mais influente do nosso tempo” e “um dos indivíduos que eu cito com mais frequência”.
O obra de Berger era “tão boa que fez com todos os teólogos quisessem ser sociólogos quando crescessem”, afirmou Gregory Thornbury, presidente da King’s College, em um tuíte que também enalteceu o pesquisador Rodney Stark.
“Houve poucos estudiosos de espírito tão independentes e influentes como Berger”, tuitou Hunter Baker, autor de “The End of Secularism” e professor de ciência política na Union University.