Na edição de hoje da Visão, publico um texto de balanço destes quase nove meses de pontificado franciscano, a partir da exortação Evangelii Gaudium. Fica aqui a seguir o início desse texto, como aperitivo para quem quiser ler:
O líder dos católicos quer
uma Igreja desassossegada e virada do avesso, os pobres no centro da acção e políticas
contra uma economia que “mata”. As intuições de Francisco eram conhecidas desde
a sua eleição, mas o documento publicado na semana passada torna claro todo o
seu programa. A revolução franciscana começou.
A revolução está em
marcha. E começou onde muitos não esperariam: na semana passada, o Papa Francisco
publicou a exortação Evangelii Gaudium
(A alegria do evangelho) que sistematiza muito do que ele tem andado a propor e
a dizer mas, mesmo assim, deixou meio mundo espantado com a ousadia. No texto,
o primeiro Papa latino-americano propõe uma reforma profunda da Igreja que a
torne numa comunidade de desassossego – “Não podemos ficar tranquilos”. Critica,
com dureza, a actual “ditadura de uma economia sem rosto” e que “mata”, diz que
a inclusão social dos pobres e a questão da paz e do diálogo social são as duas
questões determinantes do futuro da humanidade e sugere que o catolicismo tem
de assumir um novo dinamismo missionário sobretudo em relação às culturas
urbanas.
Na sua perspectiva, no horizonte
e no centro da actividade da Igreja ou da política, deve estar a pessoa. “Há
uma crise antropológica profunda: a negação da primazia do ser humano”, sublinha
o Papa Bergoglio. Os mais pobres e vulneráveis devem ser os primeiros
destinatários da acção da Igreja e dos sistemas políticos e financeiros.
Objectivo da proposta: a “revolução da ternura”.
Este documento culmina quase
nove meses intensos, desde a eleição de Francisco, a 13 de Março, depois da
resignação de Bento XVI. Meses que puseram a Igreja Católica a mexer de forma
inusitada. E que já tiveram consequências, mesmo fora do catolicismo: o dia de jejum
e oração pela paz na Síria, convocado pelo Papa Francisco, aliado às suas
críticas a uma possibilidade de intervenção militar internacional, foram um dos
obstáculos principais à entrada dos Estados Unidos na guerra que assola o país
há quase três anos; e a sua ida a Lampedusa, na primeira viagem fora de Roma,
para condenar a “globalização da indiferença”, obrigou a Europa a olhar para a
ilha que acolhe tantos refugiados (ou recolhe os seus cadáveres) – três meses
depois, Durão Barroso foi a Lampedusa, sendo recebido aos gritos de
“assassinos”...
Há apenas um mês, Bergoglio
já provocara um pequeno terramoto no interior do catolicismo, com a divulgação
do documento preparatório do Sínodo dos Bispos sobre a família, que decorrerá
em Outubro de 2014. No inquérito, há perguntas acerca do modo como os casais
católicos vivem ou encaram a sexualidade, ou sobre como a Igreja deve lidar com
os divorciados que voltaram a casar ou as uniões homossexuais. O inquérito, que
não é da responsabilidade directa do Papa, mas tem a sua orientação clara por trás,
foi apresentado como destinado a ser respondido pelo maior número possível de
crentes – em vários países, os bispos colocaram-no mesmo na internet – mas não
deixou de provocar tensão em diferentes sectores, que o procuraram relativizar.
Quatro semanas antes, o Papa tinha reunido pela primeira vez com a comissão de
oito cardeais que criou para o ajudar no governo da Igreja e encetar um
processo de reformas – esta quinta-feira, termina a segunda reunião desse
conselho. Foi na sequência desse encontro, aliás, que o inquérito sobre a
família foi apresentado.
Com a exortação
apostólica da semana passada, as principais intuições e propostas do Papa
Francisco ficam sistematizadas num único texto. Melhor ainda: ele diz qual é o
seu sonho para a Igreja e o mundo, um pouco à semelhança do discurso de Martin
Luther King. O sonho do discípulo de Jesus “não é estar cheio de inimigos, mas antes que a Palavra
[de Deus] seja acolhida e manifeste a sua força libertadora e renovadora”,
escreve. E acrescenta: “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar
tudo” na Igreja e de “chegar a todos”. E, sobre como organizar o mundo, diz, no
ponto 192, que o sonho “voa ainda mais alto” e inclui o “sustento para todos”,
bem como “educação, acesso aos cuidados de saúde e especialmente trabalho” e
“salário justo” que permita “o acesso adequado aos outros bens que estão
destinados ao uso comum”.
Esta exortação apostólica, o segundo tipo de
documento mais importante, depois das encíclicas, acaba, assim, por
constituir o verdadeiro documento programático para o pontificado franciscano.
A questão política e económica aparece como prioritária, na afirmação de que o
sistema deve estar ao serviço de todas as pessoas e em especial dos mais
frágeis.
(o artigo completo pode ser lido aqui)
(o artigo completo pode ser lido aqui)
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