Istambul (ou Constantinopla) foi, durante séculos, lugar de encruzilhadas geográficas, culturais, religiosas e políticas. Tal como outras cidades – Tessalónica ou Jerusalém, por exemplo –, atraiu a si pessoas idas de diferentes latitudes, culturas ou credos.
Um dos notáveis que viveram na cidade foi Dimitrie Cantemir (1673-1723), príncipe da Moldávia, que chegou a Istambul em 1693, com 20 anos. Ali viveu cerca de duas décadas, primeiro como penhor da fidelidade do seu pai ao sultão, depois como representante diplomático do pai e do irmão enquanto governadores da Moldávia.
Interessado por história, pelo estudo das religiões e da filosofia, artes e música, ficou conhecido como intérprete de tanbur, uma espécie de alaúde, no qual seria exímio: “Nenhum constantinopolitano podia tocar melhor que ele”, escrevia o cronista Ion Neculce, citado por Jordi Savall no livro que acompanha o disco. Cantemir reuniu na antologia “Livro da Ciência da Música” 355 composições (nove das quais compostas por ele próprio) naquela que é a mais importante colecção de música instrumental otomana dos séculos XVI
e XVII conhecida.
No disco, Jordi Savall coloca em diálogo a música do “Livro da Ciência da Música”, da corte otomana do século XVII, com a música tradicional sefardita (dos judeus oriundos de Espanha e Portugal) e arménia, populações acolhidas no império da Sublime Porta e representadas nos músicos da corte. O disco recria esse ambiente reunindo músicos da Turquia, Arménia, Israel, Marrocos e Grécia, além dos do Hespèrion XXI. Como nota Savall, sabemos muito pouco do Império Otomano. Por isso este disco é também uma revelação do gosto pela música numa nação com reputação de bárbara no Ocidente.
(Istanbul, de Dimitrie Cantemir, interpretado por Hespèrion XXI com direcção de Jordi Savall; Alia Vox, 2009; info: vgm@plurimega.com)
[Texto publicado na revista Além-Mar, de Novembro de 2009]
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