sábado, 14 de dezembro de 2013

A alegria de ler Francisco (8) - Crítica ao capitalismo e as "derrapagens" do Papa

Três crónicas sobre a exortação apostólica Evangelii Gaudium.

No DN de hoje, Anselmo Borges, que já escrevera sobre o documento na semana passadadiz:

A causa de Deus é a causa do ser humano, de todo o ser humano, feliz e pleno, começando, evidentemente, pelos mais pobres e marginalizados, os das periferias. Essa tem de ser também a causa da Igreja. Por isso, escreve [o Papa]: para quem quer seguir o Evangelho “há um sinal que nunca deve faltar: a opção pelos últimos, por aqueles que a sociedade descarta e deita fora”. “Estamos chamados a descobrir Cristo neles, a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas.” Por isso, hoje devemos dizer “não a uma economia da exclusão e da desigualdade social. Esta economia mata. Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem-abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos na Bolsa. Isto é exclusão. Hoje tudo entra no jogo da competitividade e da lei do mais forte, em que o poderoso engole o mais fraco”, e a consequência é que “grandes massas da população vêem-se excluídas e marginalizadas” e os excluídos não são “explorados”, mas resíduos, “sobras”. (...)
Francisco: um perigoso esquerdista? Enquanto uma certa esquerda faz aproveitamento político-partidário, a ultradireita, como o Tea Party, acusa-o de marxismo. Mas ele apenas anuncia o Evangelho, cujo único interesse é a vida plena para todos. “Não podemos mais confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado.” Assim, pede a Deus que “nos conceda mais políticos que tenham verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres.”

O artigo pode ser lido na íntegra aqui.

No Jornal de Letras de terça-feira, dia 10, Teresa Toldy escreve sobre “Uma crítica profunda ao capitalismo”:

(...) Concentrar-me-ei, contudo, aqui, apenas na crítica profunda que o Papa faz às sociedades capitalistas, de consumo, e ao próprio capitalismo. E começarei por dizer que me parece importante destacar que o Papa não perspetiva as suas críticas à sociedade capitalista e de consumo no quadro de um pensamento que não põe em causa o próximo sistema. Por isso, será, no mínimo, redutor e “silenciador” da novidade do documento dizer que Francisco se limita a repetir o que a Igreja, na sua Doutrina Social, diz desde Leão XIII, ou que é “maravilhoso” termos tido uma sequência de Papas que vêm sempre dizendo o mesmo. (...)
É que do que Francisco fala é da necessidade de mudar o sistema estruturalmente. (...) Ora, segundo Francisco, o crescimento em equidade, portanto, respeitador da dignidade e do bem comum, exige “decisões, programas, mecanismos e processos especificamente orientados para uma melhor distribuição do acesso, uma criação de fontes de trabalho, uma promoção integral dos pobres que supere o mero assistencialismo” (nº 204). (...)
Não creio que estas afirmações estejam em linha com as críticas demolidoras de Papas anteriores às teologias da libertação. Parece-me mesmo possível ler nas entrelinhas deste documento uma crítica à crítica e perseguição às teologias da libertação. De contrário, como interpretar estas palavras do Papa Francisco, referindo-se à opção da Igreja pelos pobres, inscrita em textos bíblicos?: “É uma mensagem tão clara, tão direta, tão simples e eloquente, que nenhuma hermenêutica eclesial tem direito de relativizar. A reflexão da igreja sobre estes textos não deve obscurecer ou debilitar o seu sentido exortativo, mas sim ajudar a assumi-los com coragem e fervor. (...)” (nº 194).

O texto completo está disponível aqui.

Do Brasil, chega o texto do bispo de Dourados, Redovino Rizzardo, com o título “As derrapagens do Papa Francisco”, criticando uma afirmação de dois padres católicos que falam das “derrapagens doutrinais” do Papa.
Escreve o bispo Rizzardo:

As críticas dos padres demonstram que, para acolher a novidade trazida pelo Evangelho, não apenas os leigos, mas também as suas lideranças, precisam da sabedoria do coração, que só vinga em pessoas que colocam o bem da Igreja e da humanidade acima de seus interesses e traumas. (...)
A reforma da Igreja vai muito além da mera atualização das suas estruturas. Ela concretiza-se numa fé e numa espiritualidade que demonstram o amor de Deus pela humanidade. Por isso, uma Igreja que atrai, motiva e converte pela compreensão e benevolência de seus pastores, jamais pela imposição e prepotência.

O texto pode ser lido aqui na íntegra.


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