Se fosse viva, Maria de Lourdes Pintasilgo completaria 80 anos no próximo dia 18. Assianalando a data, a RTP 2 vai estrear um documentário de Graça Castanheira, no próximo dia 16 (sábado), às 21h00. Antes disso, na quarta-feira, também às 21h00, o documentário será apresentado em antestreia no Auditório 2 da Fundação Gulbenkian, em Lisboa.
Já na parte final da sua vida, Pintasilgo presidiu à Comissão Independente População e Qualidade de Vida, que produziu o relatório "Cuidar o Futuro" (ed. Trinova). Trata-se de um texto fundamental para entender o nosso mundo, os grandes desafios e as soluções possíveis para os enfrentar. Nele se percebe o entendimento holístico que a antiga primeiro-ministro portuguesa tinha sobre a realidade. O modo como ela olhava o mundo fazia-nos perceber que os problemas se resolvem em articulação uns com os outros - e aí está a chave de sobrevivência do planeta e das futuras gerações. E se as questões são complexas, há modos de desatar os nós.
A propósito: não deveria alguém (mesmo uma instituição como a Assembleia da República) pensar em reeditar o texto, já que a editora que o publicou praticamente desapareceu e o livro é difícil de encontrar?
Alguns excertos das conclusões deste documento que, quase década e meia depois de concluído, está mais actual do que nunca:
- As nações desenvolvidas devem contribuir activamente e de modo credível para a desmilitarização da vida, já que nenhum Estado que tira proveito da guerra pode ser credível quando defende a paz. (...) A assistência militar, frequentemente "disfarçada" de assistência para o desenvolvimento, deve diminuir ainda mais e ser suprimida gradualmente.
- Uma crise ameaçadora de falta de água não pode ser resolvida sem mudanças políticas importantes. A água pode ser tratada e reutilizada. (...) P. ex., utilizar a água já usada, após tratamento, para irrigação e reduzir o problema dos esgotos despejados no oceano.
- É urgente aumentar substancialmente o financiamento da investigação e das aplicações em larga escala das energias renováveis.
- A política social está no centro das responsabilidades do Estado. (...) Um governo central não pode deixar de assegurar os meios e as obrigações financeiras do Estado socialmente consciente (educação, saúde pública, política habitacional, recuperação urbana), ainda que estes devam ser assegurados nos níveis governamentais mais baixos, de acordo com o princípio da subsidiariedade. (...) Tais serviços são inevitavelmente assegurados com a plena participação das pessoas envolvidas.
- Defendemos uma reorientação nos recursos financeiros que permita a transição de um modelo curativo superdesenvolvido, baseado no hospital, para clínicas comunitárias locais de cuidados primários, programas de cuidados ao domicílio e iniciativas de prevenção.
- Os programas voluntários de planeamento familiar são muito mais eficientes do que aqueles que envolvem coerção para promover o uso permanente de contraceptivos e para estimular famílias pequenas.
- Todos os processos sociais devem sublinhar o papel central dos direitos das mulheres (...). A legislação sobre a paridade da remuneração deve ser adoptada e difundida, por toda a aprte, para se conseguir a aplicação universal do princípio do salário igual para trabalho igual.
- O ponto de partida de um novo contrato social será o reconhecimento jurídico e pragmático de que a soberania reside nas pessoas: são elas que devem tornar-se sujeitos da melhoria da qualidade de vida. Dar poder às pessoas não é um desejo abstracto. Consiste em inúmeros diálogos e acções, projectos concretos, todos dentro de um quadro legal.
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