segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Igreja e cultura: cada vez mais longe?

Em Igreja e cultura: cada vez mais longe?, da autoria de José María Poirier, da revista Critério (transcrito pelo site Mirada Global), debatem-se os desafasamentos e mediações possíveis entre a doutrina da Igreja e a cultura, sobretudo entre as gerações mais jovens e, em particular, a propósito das questões da sexualidade. O trecho seguinte é apenas um pequeno extracto de um texto mais longo, que merece leitura:
" (...) Esta transformação da sensibilidade e dos valores, que leva à rejeição das normas e certezas tradicionais a favor de uma liberdade carente de referências firmes, é algo observável de um modo muito directo na conduta das gerações mais jovens. Estas tendem cada vez mais a gerir sua vida sexual quase exclusivamente em base ao critério da autenticidade afectiva. O casamento vai perdendo o carácter de horizonte natural do noivado, e aqueles que decidem casar-se o fazem hoje, em sua maioria, depois de experiências mais ou menos prolongadas de convivência. E não estamos falando de algo que aconteça só fora da Igreja. Muitos católicos adoptam estes novos estilos de vida sem sentir que estão pondo em jogo sua fé ou sua pertença religiosa.

Encontramos aqui um traço característico deste giro cultural: não se realiza contra a Igreja, isto é, não está necessariamente vinculado a uma postura de princípio contrário à fé ou à instituição eclesial (ainda que assim certas reivindicações particulares possam ser apresentadas publicamente). Pelo contrário, é uma mudança que acontece na maioria dos casos à margem da Igreja, isto é, em virtude de uma busca pessoal simplesmente alheia a tudo o que não for experimentado como significativo para si, muito além do que ela “diga” permita ou proíba.

Aqui parece localizar-se, então, o problema de fundo: a brecha crescente entre a Igreja e a cultura, entre seus ensinamentos e a vida da sociedade, sem excluir a vida dos fiéis. Não se trata tanto da verdade ou do valor da doutrina católica sobre a sexualidade em si mesma, quanto de sua relevância, isto é, de sua capacidade para modelar efectivamente a vida das pessoas. Precisamente, a percepção de uma perda dramática de relevância do ensino da Igreja está suscitando há anos profundas tensões no seio da mesma entre os que, por toda resposta, protegem a “doutrina segura”, e aqueles que no outro extremo procuram “chegar” às pessoas, através de propostas atraentes mas aventuradas, sem nenhuma continuidade possível com a Tradição(...)".

Eis-me aqui

«Eu manifestei-me àqueles que não me consultavam, saí ao encontro dos que não me buscavam. Dizia: «Eis-me aqui» a um povo que não invocava o meu nome»
(Is 65, 1)

domingo, 28 de novembro de 2010

Bento Domingues: Não há teologias definitivas

No "Público" de 28 de Novembro de 2010

Anselmo Borges: A Igreja e os sinais dos tempos

Anselmo Borges no DN de 27 de Novembro de 2010:

"Não foi por acaso que a revelação sobre o uso do preservativo apareceu no mesmo dia em que o Papa impôs o barrete a mais 24 cardeais. No dia seguinte, lembrou-lhes que devem estar sempre junto de Cristo na cruz. Mas cá está! No meio de todo aquele aparato do Vaticano, há aqui uma contradição entre a pompa e a cruz. Há aquele texto do filósofo dinamarquês Sören Kierkegaard, que diz mais ou menos assim: vai Sua Excelência Reverendíssima o Bispo de Copenhaga, revestido de paramentos com filamentos de ouro e um báculo e uma mitra debruados de pedras preciosas, com todo o seu séquito em esplendor, senta-se num cadeirão de prata e dá início à sua homilia sobre a pobreza. E ninguém se ri!..."

Ler tudo aqui.

sábado, 27 de novembro de 2010

Vigília pela vida nascente. E pela vida e dignidade ameaçadas?

Há muitas e boas razões para fazer uma vigília pela vida nascente, iniciativa desejada pelo Papa Bento XVI e seguida hoje em muitos lados, nas igrejas locais.
Ainda que não simpatize com algum fundamentalismo, obsessão e reduccionismo de movimentos que gravitam em torno da "defesa da vida", reconheço que é sempre pouco o que se faz para criar condições para que novos seres humanos possam vir ao mundo em condições de acolhimento do mistério da vida e de justiça e paz nos contextos de crescimento das crianças. É necessário promover a vida e combater o que a limita e entrava, nas suas causas mais profundas. O aborto será porventura um desses entraves, mas sou levado a crer que ele é mais um sintoma do que uma causa (ainda que de resultados trágicos).
Dito isto, não posso deixar de anotar que não vejo na Igreja a mesma acutilância, o mesmo investimento de energias noutros campos onde a vida (e a dignidade das pessoas) se joga, como ocorre com a "vida nascente". A prova é que, num contexto como o dos países europeus, nomeadamente, em que se vive uma crise gravíssima, que lança a cada dia milhares de pessoas para a valeta da sociedade, não há uma vigília da escala da de hoje, que alerte a consciência dos cristãos e de toda a sociedade. Quem diz uma vigília, diz outra forma de, liturgicamente, em ambiente celebrativo, fazer da crise e da procura de caminhos para a enfrentar o mote para a reunião dos cristãos.
Os jovens que não encontram de que viver e condições para constituir família; os de meia-idade que se vêm subitamente desempregados e tornados inúteis; os idosos cada vez mais abandonados e espoliados; os que trabalham e que, tantas vezes, se deparam com verdadeiros atentados à sua dignidade de trabalhadores; o mercado selvagem que tudo contamina - é a vida, o seu sentido e os seus limites, que está em causa. Olhe-se para a Irlanda, para a Grécia, para Espanha, para Portugal e vários outros países - se há "nova evangelização" em perspectiva, ou ela aterra aqui, nestes dramas, nestes impasses, nestes labirintos ou simplesmente não será.

"Não mais haverá noite"

Mostrou-me, depois, um rio de água viva, resplendente como cristal, que saía do trono de Deus e do Cordeiro.
No meio da praça da cidade e nas margens do rio está a árvore da Vida que produz doze colheitas de frutos; em cada mês o seu fruto, e as folhas da árvore servem de medicamento para as nações.
E ali nunca mais haverá nada maldito. O trono de Deus e do Cordeiro estará na cidade e os seus servos hão-de adorá-lo e vê-lo face a face, e hão-de trazer gravado nas suas frontes o nome do Cordeiro.
Não mais haverá noite, nem terão necessidade da luz da lâmpada, nem da luz do Sol, porque o Senhor Deus irradiará sobre eles a sua luz e serão reis pelos séculos dos séculos.

Apocalipse 22,1-5

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O Papa, o preservativo e o debate mediático

O debate sobre o novo livro do Papa Bento XVI, Luz do Mundo, centrou-se na questão do preservativo. A propósito, anotei no Público algumas observações em forma de comentário.

Um texto onde se faz a apresentação do livro, de outros temas e polémicas que já levantou pode ser lido também aqui.

Pequenos excertos sobre outros temas podem ser lidos ainda aqui.

sábado, 20 de novembro de 2010

Homens que são como lugares mal situados

Daniel Faria






















Homens que são como lugares mal situados
Homens que são como casas saqueadas
Que são como sítios fora dos mapas
Como pedras fora do chão
Como crianças órfãs
Homens agitados sem bússola onde repousem

Homens que são como fronteiras invadidas
Que são como caminhos barricados
Homens que querem passar pelos atalhos sufocados
Homens sulfatados
Por todos os destinos
Desempregados das suas vidas

Homens que são como a negação das estratégias
Que são como os esconderijos dos contrabandistas
Homens encarcerados abrindo-se com facas

Homens que são como danos irreparáveis
Homens que são sobreviventes vivos
Homens que são sítios desviados
Do lugar
....
Homens que são como projectos de casas
Em suas varandas inclinadas para o mundo
Homens nas varandas voltadas para a velhice
Muito danificados pelas intempéries
Homens cheios de vasilhas esperando a chuva
Parados à espera
De um companheiro possível para o diálogo interior

Homens muito voltados para um modo de ver
Um olhar fixo como quem vem caminhando ao encontro
De si mesmo
Homens tão impreparados tão desprevenidos
Para se receber

Homens à chuva com as mãos nos olhos
Imaginando relâmpagos
Homens abrindo lume
Para enxugar o rosto para fechar os olhos
Tão impreparados tão desprevenidos
Tão confusos à espera de um sistema solar
Onde seja possível uma sombra maior
...
Não levantemos os homens que se sentam à saída
Porque se movem em seus carreiros interiores
Equilibram com dificuldade uma ideia
Qualquer coisa muito nítida, semelhante
A uma folha vazia
E põem ninhos nas árvores para se libertarem
Da gaiola terrível, invisível muitas vezes
De tão dura
Não nos aproximemos dos homens que põem as mãos nas grades
Que encostam a cabeça aos ferros
Sem outras mãos onde agarrar as mãos
Sem outra cabeça onde encostar o coração
Não lhes toquemos senão com os materiais secretos
Do amor.
Não lhes peçamos para entrar
Porque a sua força é para fora e a sua espera
É a fé inabalável no mistério que inclina
Os homens por dentro
Não os levantemos
Nem nos sentemos ao lado deles.
Sentemo-nos
No lado oposto, onde eles podem vir para erguer-nos
A qualquer instante

Daniel Faria, “HOMENS QUE SÃO COMO LUGARES MAL SITUADOS”, 1998

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Comissão Justiça e Paz e o desafio da mudança


A Comissão Nacional Justiça e Paz e a Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa organizam neste sábado, em Lisboa, a conferência "O Desafio da Mudança Urgente – Caridade, Verdade e uma Encíclica". A entrada é livre, sendo, porém, solicitada confirmação de presença para o e-mail comissãonjp@mail.com ou para o telefone 218 855 480.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

À procura da Palavra – Estranha realeza

(Crónica do padre Vítor Gonçalves, que durante alguns anos foi publicada no jornal Voz da Verdade. O Religionline tem muito gosto em publicá-la semanalmente, a partir de agora.)

“Hoje estarás comigo no paraíso.” (Lc 23, 43)
Domingo de Cristo Rei

Ficamos impressionados (e talvez incomodados) com a mega operação de segurança em torno da Cimeira da Nato realizada nestes dias em Lisboa. A vinda de mais de 50 chefes de estado e de governo e as numerosas comitivas obriga a rigorosas medidas de segurança e logística. E se os perigos são reais, também cresce uma sensação de aparato e ostentação que os “senhores deste mundo” persistem em cultivar. As menos de 24 horas de encontros e trabalho real pela segurança do mundo e o seu desenvolvimento irão produzir algo verdadeiramente benéfico? Esperamos que sim, para que não fique destes dias um amargo sabor a vaidade e desperdício!

Prestes a dar o último suspiro, pregado na cruz, Jesus é interpelado, por três vezes, pela mesma frase: “Se és o Messias…, salva-te a ti mesmo.” Repete-se a tentação do deserto. Jesus procurou sempre batalhar contra as ideias erradas acerca da sua “realeza”: não se centra em si mesmo, não age em seu benefício, não usa o poder para dominar nem para criar dependência. A loucura da cruz incomoda, porque quem não procura salvar-se a si mesmo, e sim, salvar todos os que puder, revela um amor que nada pode destruir. Que ninguém pode dominar ou manipular. Estranha realeza esta, que recusa os métodos habituais de conquista das multidões e de senhorio do mundo. A realeza fraca e pobre de um Deus crucificado!

No meio da algazarra e do espectáculo doloroso do calvário, por entre as vozes de zombaria e insulto, Jesus é atraído pelo sofrimento de um dos malfeitores. Sempre quem sofre a ter um lugar único no seu coração! É muito difícil para nós, que vivemos a dor fechando-nos em nós próprios, nesses momentos compreender o sofrimento dos outros. Dor e amor parecem-nos irreconciliáveis. Mas Jesus, no meio da maior dor, mostra o maior amor do mundo. Tinha chamado os discípulos para andarem com Ele, e levava consigo um discípulo nascido no meio do maior sofrimento. Um discípulo sem currículo, com práticas muito reprováveis, mas capaz de se compadecer e de acreditar. Estranho rei que não tem guarda-costas nem exército, mas é defendido pelo mais improvável dos advogados. Aquele que não se fechou na sua dor e fez sua a dor de Jesus. Teve 20 valores na prova prática do mandamento do amor!

Fecha-se a cortina do ano litúrgico e anuncia-se o nascimento de um “Deus despido”. O calvário e Belém tão próximos. A cruz e a manjedoura: únicos tronos deste estranho rei! Escrevia o pastor protestante Bonhoeffer, morto por ordem de Hitler: “Deus deixa-se empurrar para fora do mundo e pregar na cruz. Deus é impotente e fraco no mundo, e assim somente, ele está connosco e nos ajuda…”.

Bento XVI e a Europa

Músicas que falam com Deus (6) - Liturgia e poesia em disco

O CD “Vento”, interpretado pelos “Sete Lágrimas”, que corresponde a uma Missa de Pentecostes encomendada pela Capela do Rato, em Lisboa, inclui dez composições concebidas a partir de textos litúrgicos e poemas de Teixeira de Pascoaes, Sophia de Mello Breyner Andresen, Mário Cesariny, Maria Gabriela Llansol e José Augusto Mourão. O Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura disponibilizou os textos que acompanham o disco, bem como uma das faixas.
| ÁUDIO |

Sinais que chegam da América

  • Notícia "Hacia que Iglésia vamos?", do blog ENCOMUN
  • Notícia "L'archevêque de New York élu président de la Conférence des évêques des USA", em La Croix [Sobre este último link, vale a pena complementar o que diz e sugere com a análise feita por Michael Sean Winters em "What happened in Baltimore?"

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Comunicar também é escutar

Com que palavras apalavramos o conceito e a prática da comunicação?
Com termos como anúncio, informação, pregação, arenga, transmissão, …
E que significado de comunicação está contido neste modo de a enunciar? 
Vias de sentido único, mensagens unidireccionais, fluxos predominantes de A para B.  
Onde é que esse modo hegemónico de comunicar prevalece?
Na escola, na igreja, nos media, na política e em muitos outros espaços institucionais.
Há outros modos e modelos de comunicar?
Certamente que sim: a comunicação assente no diálogo, na escuta, na reciprocidade de papeis, na troca de pontos de vista, nos gestos partilhados…
Serão os dois modelos antagónicos ou mutuamente exclusivos?
Longe disso.  Nenhum deles pode prescindir do outro, ainda que possamos, de acordo com a inércia, a vontade e o contexto, acentuar mais um do que outro. Mas a comunicação humana carece tanto da informação que capacita  e abre horizontes quanto da relação que se estabelece e refaz no acontecer da própria comunicação. Não é, portanto, mero problema de linguagem – mais acessível ou mais hermética, mais clássica ou mais moderna – que está em jogo, mas um problema de atitude.
Estas reflexões surgem a partir de um evento que acaba de ocorrer em Roma, por iniciativa do Conselho Pontifício para a Cultura com o tema "Cultura da comunicação e novas linguagens" e que se apresentou com algumas novidades dignas de nota. Realizou a sessão de abertura no Capitólio, fora do Vaticano; juntou gente muito diversa, das artes, do pensamento, das letras e das indústrias criativas; enfim, quis olhar para um problema crucial da contemporaneidade – o da (in)comunicação, com olhos multidisciplinares, incluindo, naturalmente, o religioso.
A avaliar pelo que, a propósito, disseram os responsáveis máximos do Vaticano, a tónica voltou a ser colocada na forma da linguagem (carecendo de aggiornamento na Igreja) e nos meios para a veicular. "A necessidade de encontrar uma linguagem verdadeiramente mais capaz de sintonizar com a cultura e com o homem de hoje é imprescindível", declarou D. Gianfranco Ravasi, não sem advertir que “há palavras que devem ser conservadas".
Eu não me preocuparia tanto com a efectividade da linguagem, a novidade das palavras e dos media, ainda que reconheça residir ai uma parte do problema. Preocupar-me-ia, sim, com as mediações e com o cultivo de uma atitude de escuta, em que se possam intercambiar mensagens que circulem em múltiplas direcções e não em sentido único.

[Texto publicado no diário digital Página 1, da Renascença, em 15.11.2010]

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um pequeno conforto

" [...] Gosto muito deste conto de Raymond Carver e já o tenho repetido. O que aprecio nele é sobretudo mostrar como as cenas da vida quotidiana, mesmo as mais dramáticas, nos podem abrir aos grandes espaços da experiência interior. As palavras criam um clima de acolhimento e escuta. O alimento consola, enxuga as lágrimas. Dentro das personagens acontece uma espécie de ressurreição. De facto, quando a gente aceita que mesmo sobre aquilo que nos parece imperdoável há mais do que um ponto de vista, ou quando compreendemos que, em grande parte das situações, mais do que premeditação o que existe é ignorância, então estamos prontos para encontrar perdão nos nossos corações.
Torna-se finalmente claro que o conforto que falta à nossa vida é bem mais pequeno do que supomos. Basta-nos o conforto de atravessar ao lado de outros a nossa noite e assistir aí, esperançados, à chegada da manhã.

[Para ler a súmula da historia: AQUI.]

José Tolentino Mendonça, in Diário de Notícias da Madeira, 14.11.10

Bento Domingues: Espanha pouco católica

Frei Bento Domingues no "Público" de 14 de Novembro de 2010

domingo, 14 de novembro de 2010

Papa pede reforma profunda da economia mundial

O Papa Bento XVI apelou, neste domingo, a uma reforma profunda da economia mundial. Fê-lou pucos dias depois de mais uma quase inútil cimeira do G20, desta vez na Coreia do Sul, cimeira à qual, aliás, tinha dirigido uma carta.

A actaul crise “reclama uma mensagem de firmeza apelando a uma profunda reforma do modelo de desenvolvimento económico mundial”, disse o Papa. “As economias dos países ricos não devem tentar alcançar alianças vantajosas que podem ter graves consequências para os países mais pobres”.

O essencial das afirmações de Bento XVI está aqui.

Causas dos abusos sexuais por parte de membros do clero

A questão central com que a Igreja deveria lidar, na gestão dos múltiplos casos de abuso sexual de membros do clero sobre crianças em diferentes partes do mundo está na questão e na natureza do poder, no interior da instituição eclesiástica. Esta é a perspectiva do Pe. Tom P. Doyle, dominicano e doutorado em Direito Canónico, que há mais de 25 anos fez da intervenção sobre este problema a causa da sua vida. Em 1984, renunciou a uma carreira como canonista e diplomata, ao abandonar o lugar de especialista em Direito Canónico na Nunciatura do Vaticano em Washington, para se dedicar ao trabalho com as vítimas de abusos e respectivas famílias, assim como com a bispos e outros altos responsáveis da Igreja, nas dimensões canónica e pastoral.
O vídeo refere-se a uma conferência que fez na semana passada em Sidney, Austrália, na Inaugural Australasian Clergy Abuse Reparation & Prevention Conference .



Informação complementar:

sábado, 13 de novembro de 2010

Anselmo Borges: Protesto, luto e reflexão

A sabedoria da história bíblica das vacas gordas e das vacas magras - armazenar no período da abundância para os tempos de dificuldade - há muito que foi esquecida entre nós. E aí está a crise, incalculável, na perplexidade, e sobretudo sem horizontes de futuro. Ninguém nos diz o que se pode razoavelmente esperar, depois de tanta crise e sacrifícios sem fim, e este é o perigo maior.

Há a crise mundial, uma imensa interrogação sobre o que ainda se chama União Europeia, a subordinação da política ao poder económico-financeiro. Entre nós, é tudo isto. Mas não só.

É certo que o País mudou, e nem tudo foi mau. A rede viária, por vezes até com excessos desnecessários - que interesses estavam em causa? -, permite comunicação rápida. Pôs-se fim ao analfabetismo. Há nichos de excelência na investigação e no ensino. Houve alguma mudança nas mentalidades, a convivência com outras culturas e religiões é boa. Grandes camadas da população viram o seu nível de vida melhorado.

Mas, depois, há perguntas que inevitável e desesperadamente se colocam, e todas, quando se pensa na situação presente e no que aí vem, convergem para esta: como foi possível chegar à beira do abismo em que nos encontramos? (...)


Texto de Anselmo Borges no DN de hoje. Ler tudo aqui.

Morreu o compositor Henryk Górecki



O compositor polaco Henryk Górecki morreu ontem em Katowice, noticiou o Público. A Sinfonia n.º 3, a chamada "Sinfonia das Canções Tristes", editada em 1992 em homenagem às vítimas do Holocausto, é uma das suas obras mais conhecidas.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Estreia o filme "Dos Homens e dos Deuses"

Estreia esta semana o filme "Dos Homens e dos Deuses", de Xavier Beauvais, Grande Prémio do Festival de Cannes.


Oito monges católicos franceses vivem em harmonia com a população muçulmana, até que, progressivamente, a violência e o terror tomam conta da região. Apesar das ameaças, os religiosos decidem resistir ao terrorismo e ficar. Esta é a história verídica dos monges de Tibhirine, raptados e assassinados por um grupo de fundamentalistas islâmicos durante a guerra civil argelina, em 1996.  
(Nota de apresentação do Público).

Alguém que tenha visto o filme quer comentar aqui?


Informação complementar:  

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Juan Masiá debate livro de Anselmo Borges

A apresentação do livro «Religião e Diálogo Inter-Religioso», do teólogo e filósofo Anselmo Borges, da Universidade de Coimbra, será o pretexto para um colóquio a realizar pelo Centro de Reflexão Cristá, em Lisboa, no próximo dia 16, às 18h30. Nesta iniciativa, que decorrerá nas instalações do Centro Nacional de Cultura (Largo do Picadeiro, nº 10, 1º, Metro: Baixa-Chiado) está prevista a participação do teólogo jesuíta espanhol Juan Masiá (Universidade Sophia, Tóquio) e Miguel Oliveira da Silva (Universidade de Lisboa / Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida), seguida de debate moderado pelo autor do livro.

Secularismo: Teoria e Prática em Diálogo

"O secularismo é, sem dúvida, um dos alicerces da auto-imagem ideológica da Europa" afirmam, na respectiva apresentação, os organizadores do curso "Secularismo: Teoria e Prática em Diálogo", que o Centro de estudos Socaiis da Universidade de Coimbra organiza nos próximos dias 19 e 20.

Este curso de formação avançada irá apresentar um panorama das questões do secularismo, combinando várias disciplinas que o têm como objecto de investigação: teologia, filosofia, antropologia e sociologia. O curso de formação avançada será ainda complementado por uma discussão em mesa redonda com Fernando Catroga (FLUC) sobre o tema de uma das suas mais recentes obras – o secularismo e a república.
Oradores:
  • AbdoolKarim Vakil (Department of Spanish, Portuguese and Latin American Studies/ Department of History, King's College London )
  • Angelo Cardita (CES)
  • Clemens Zobel (CES)
  • João Cardoso Rosas (Universidade do Minho)
  • Mathias Thaler (CES)
  • Roberto Merrill (Universidade do Minho)
  • Silas Oliveira
  • Teresa Toldy (CES/Universidade Fernando Pessoa, Porto)
Inscrições até sexta-feira, dia 12, AQUI.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Arcebispo de Bruxelas: condutor em contramão, sob fogo mediático

A Igreja Católica da Bélgica encontra-se numa crise profunda, agravada de forma exponencial este ano, pelos casos de pedofilia entre membros do clero. Mas quando se esperaria que quem dirige a instituição mostrasse bom senso e equilíbrio, eis que o que sucede é exactamente o contrário: o seu responsável máximo parece apostado em atirar gasolina para o incêndio.
Tendo sucedido em Janeiro último ao cardeal Daneels, outrora um prestigiado membro da hierarquia da Igreja, mas que esteve nos últimos meses sob a acusação de ter dado cobertura a pelo menos um caso de abusos sexuais continuados, o do bispo de Bruges, o seu sucessor, o arcebispo-primaz André-Joseph Léonard, não se tem cansado de provocar a polémica. Primeiro, foi acusado de considerar a SIDA uma "justiça imanente", espécie de castigo para pessoas que abusaram do corpo. Noutra ocasião, referiu-se à homossexualidade em termos que suscitaram a associação a uma doença semelhante à anorexia. Mais recentemente, perante uma sociedade chocada com a Igreja por causa da pedofilia, foi ao ponto de sugerir que os padres acusados desse crime não deveriam ser punidos pelo poder eclesiástico, mas antes deveriam poder viver tranquilos os anos que lhes restam de vida.
A tudo isto o visado responde (extenso comunicado difundido ontem) considerando que se trata, em boa medida, de interpretações abusivas dos media e dos comentadores e de frases eventualmente retiradas do respectivo contexto. Sobre a doença de SIDA observa que se trata de umas afirmações feitas há cinco anos, num quadro de evolução da doença diverso do actual, e que ganham agora pertinência, com a tradução do livro de 2005 para flamengo. Relativamente à homossexualidade, recorda que se limitou, num debate televisivo, a comparar "a atitude que se adopta com as pessoas anoréxic e a que devemos ter para com as pessoas homossexuais", o que não autoriza a dizer-se tratar-se nos dois casos de pessoas "anormais" ou "doentes". Finalmente, acerca de padres pedófilos, observou que se referia a casos concretos de padres de idade avançada, alguns internados em lares, relativamente aos quais os crimes prescreveram e cujas vítimas se satisfizeram com o facto de os vitimizadores reconhecerem os abusos e pedirem perdão pelo que fizeram.
Pelo menos boa parte da opinião pública belga considera estar-se perante um hierarca desbocado. A verdade é que o mal-estar na Igreja daquele país tem-se vindo a acentuar nos últimos meses e há bispos, como de Namur, que fazem questão de se distanciar dos seus posicionamentos. Há dias, Léonard fez saber que se calaria até ao Natal, uma medida apoiada pelos responsáveis de duas revistas católicas do país, mas a promessa durou poucas horas e quem não aguentou mais foi o seu porta-voz, um jovem e prestigiado teólogo leigo que anunciou ontem, em comunicado, a demissão do cargo, salientando que "o copo transbordou". E comparou mesmo o arcebispo a um condutor em contramão, convencido de que todos os outros condutores é que estão errados. Declarações que configuram "algo nunca visto na história da Igreja da Bélgica", nas palavras do chefe de redacção da revista católica daquele país "Kerk & Leven".
O que é facto é que, como dizia recentemente um dirigente católico belga, a Igreja daquele país é uma "zona sinistrada" e os factos mais recentes não são de molde a reconstruir o que tem estado a desabar.
  • Comunicado do porta-voz do arcebispo André-Joseph Léonard AQUI.
  • Comunicado do arcebispo de Bruxelas: AQUI

Ordens Religiosas em congresso inédito



(Ilustração: Giotto, Aparição de Sao Francisco no Capítulo de Arles)

Começou esta terça-feira em Lisboa (vai até sexta) o Congresso Ordens e Congregações Religiosas em Portugal - Memória, Presença e Diásporas. Este é o texto da notícia publicada aqui.
Apesar dos conflitos entre a I República e a Igreja Católica em Portugal — incluindo a medida inicial da extinção das ordens religiosas —, houve mais congregações religiosas criadas nos anos do novo regime que nas nove décadas de monarquia constitucional.
Quem o diz é o historiador José Eduardo Franco, coordenador-geral da organização do congresso Ordens e Congregações Religiosas em Portugal, que decorre entre amanhã e sexta-feira na Fundação Gulbenkian, em Lisboa. Só nos últimos três anos de República (1923-26) foram criadas em Portugal cinco novas congregações religiosas, quatro das quais de origem portuguesa, um dado que será apresentado nestes dias do congresso.
Esta é a primeira iniciativa do género no mundo a reunir tantos especialistas — há mais de 180 conferencistas oriundos de todos os continentes, e 600 participantes. Nos quatro dias de debates, serão dissecados todos os aspectos relativos às primeiras “multinacionais” católicas, as primeiras organizações a fazer a globalização, como se lhes refere o historiador.
As congregações fundadas na I República foram as Servas de Nossa Senhora de Fátima, Criaditas dos Pobres, Oblatas do Divino Coração e Religiosas Reparadoras de Nossa Senhora das Dores de Fátima. De França, veio a primeira comunidade das Irmãs da Apresentação de Maria.
No tempo da Monarquia constitucional, apenas tinham sido criadas duas congregações religiosas: as Dominicanas de Santa Catarina de Sena, por iniciativa de Teresa de Saldanha, e as Irmãs Vitorianas, dinamizadas por Mary Wilson, uma inglesa que vivia no Funchal.
O próprio Afonso Costa, líder republicano, “começou a tolerar a existência de hospitais” pertencentes a ordens religiosas, diz Eduardo Franco. Mas as medidas da I República “só fizeram bem, porque tiveram um efeito propulsor” para a acção das ordens religiosas, avalia o historiador.
Questões de natureza social, teológica, antropológica, histórica, patrimonial ou artística serão dissecadas nestes quatro dias. A par das polémicas e do papel das ordens religiosas na educação, saúde, cultura, missionação, povoamento do país e reconquista.

Em 1910, havia 33 institutos religiosos em Portugal, com mais de 3100 membros e 80 colégios (dos quais 26 continuaram a funcionar). Em 2008 eram 139 as congregações em Portugal (100 femininas), com mais de 6500 membros (das quais 5200 freiras). Das mais de 180 escolas católicas existentes no país, quase todas são de ordens e congregações.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

"Estas coisas"

«Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. 
Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. 
Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.» 
«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. 
Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 
Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.» 
[Jesus in Mt. 11, 25-30]


Uma vez, um sábio camponês de cabelos brancos aproximou-se com ar de apoquentado com esta questão: "Como é possível uma pessoa com muita instrução cometer um crime?". Comentava sob a forma de pergunta uma notícia ouvida no rádio. Ingénuo, se lhe poderia chamar. Sábio, antes, ainda que ingénuo.