quinta-feira, 15 de novembro de 2012

A liturgia, uma arte total


A liturgia deve ser uma arte total, defendeu esta quinta-feira, em Lisboa, o teólogo e frade dominicano Bento Domingues. Falando nas jornadas “Liturgia, arte e arquitectura – nos 50 anos do Concílio Vaticano II”, na Universidade Católica Portuguesa (UCP), frei Bento afirmou: “Não se pode ter uma boa igreja com uma decoração miserável; nem uma boa decoração com uma música péssima ou uma homilia desgraçada.”
Bento Domingues, que nas suas intervenções públicas tem insistido na ideia da beleza na acção litúrgica, acrescentava: “Na liturgia, a envolvência é total porque é presença e símbolo e só é eficaz quanto mais simbólica for.”
Referindo-se ao poema de Ruy Belo, “Nós, os vencidos do catolicismo”, frei Bento lamentou: “Nós, os celebrantes, tornamos Deus impossível.” E defendeu que a Constituição do Concílio Vaticano II sobre a liturgia, “Sacrossanctum Concilium”, um “bom documento”, não tem “suficientemente presente” a dimensão do mistério e da simbólica.
João Norton de Matos, padre jesuíta, falou precisamente da importância do simbólico a partir da construção do espaço litúrgico. Citou, por exemplo, o modelo da basílica romana apropriado pelas igrejas, em que o altar foi colocado ao meio, e o coro das catedrais medievais que corta completamente o espaço da assembleia, como é visível em algumas cidades de Espanha.
É esta “igreja dentro da igreja”, com o altar avançado e a assembleia envolvente, que pode ser modelo para comunidades litúrgicas contemporâneas, exemplificou. O padre João Norton referiu ainda o que se passa na Igreja de Santo Inácio, em Paris: a centralidade é colocada no ambão onde são proclamadas as leituras, na primeira parte da missa, e no altar onde se celebra a eucaristia, durante a segunda parte – pelo meio, as pessoas movimentam-se.
“Hoje, a liturgia deixou de ter símbolos, tem formalidades que já não são símbolos”, disse ainda o padre Arlindo de Magalhães, responsável da Comunidade Cristã da Serra do Pilar, em Gaia. “O momento actual pede que as igrejas recuperem os símbolos”. E citou o exemplo da fracção do pão, que deixou de ser feita. “Como se anuncia o evangelho aos adultos? Sem formação de baptizados conscientes, não há Igreja.”
Paulo Vale, curador e professor na UCP, falou do carácter iniciático da arte, à semelhança do que acontece com a liturgia, que também “não é compreensível sem explicação”. Paulo Vale colocou em contraste a arte autêntica e o “kitsch”, e contou histórias como a do Cristo da igreja de Assy (ver foto reproduzida daqui), de Germaine Richier, que foi contestado por não corresponder à estética da primeira metade do século XX. E defendeu depois que a Igreja devia ser capaz de “profanar a ideia da arte como algo separado” da vida. Ao contrário, deve propor-se a ideia de que a arte e  a vida estão ligadas.
Dos símbolos  e do espaço falou ainda Joaquim Félix de Carvalho, padre que integra a equipa de formação do seminário conciliar de Braga. A partir do caso da Capela Árvore da Vidareferiu o espaço como o segredo daquele lugar litúrgico.
Estas jornadas prosseguem nesta sexta-feira. O programa completo está aqui.


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