In Memoriam
(Ilustração reproduzida daqui)
No momento do enterro do pai, a filha do poeta Manoel de
Barros recitou um verso de que o autor gostava muito: “Do lugar onde estou,
já fui embora”.
Manoel de Barros foi-se embora. Ou, como disse a neta, Joana de Barros, citada n'O Globo, “Ele virou passarinho”.
O autor de Arranjos para Assobio (1980)
tinha um segredo para a sua arte, como recorda Luís Miguel Queirós no obituário
que escreveu no Público: “Minhocas arejam a terra, poetas
a linguagem.” No documentário Só dez por cento é mentira (2008), de Pedro Cezar, respondendo sobre
como gostaria de ser lembrado, teve a seguinte resposta: “A gente nasce,
cresce, amadurece, envelhece, morre. Para não morrer, tem que amarrar o tempo
no poste. Eis a ciência da poesia: amarrar o tempo no poste”.
Amarre-se, então, ao poste, um dos
exemplos da ciência de Manoel de Barros:
Venho de nobres que empobreceram.
Restou-me por fortuna a soberbia
Com esta doença de grandezas:
Hei de monumentar os insetos!
(Cristo monumentou a Humildade quando beijou os pés dos seus discípulos)
São Francisco monumentou as aves
Vieira, os peixes
Shakespeare, o Amor. A Dúvida, os tolos.
Charles Chaplin monumentou os vagabundos.
Com esta mania de grandeza:
Hei de monumentar as pobres coisas do chão mijadas de orvalho.
Restou-me por fortuna a soberbia
Com esta doença de grandezas:
Hei de monumentar os insetos!
(Cristo monumentou a Humildade quando beijou os pés dos seus discípulos)
São Francisco monumentou as aves
Vieira, os peixes
Shakespeare, o Amor. A Dúvida, os tolos.
Charles Chaplin monumentou os vagabundos.
Com esta mania de grandeza:
Hei de monumentar as pobres coisas do chão mijadas de orvalho.
(Manoel de Barros, Poesia completa, ed. Caminho, 2011)
(um agradecimento a Eduardo Jorge Madureira)
(um agradecimento a Eduardo Jorge Madureira)
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