Relatório apresentado esta
terça-feira em Lisboa com presença de arcebispo libanês; perseguição de
minorias e estados uniconfessionais provocam aumento dramático de refugiados;
patriarca greco-melquita traça retrato trágico da situação na Síria
Refugiados no Médio Oriente
(foto reproduzida daqui)
A liberdade religiosa está numa
fase de “grave declínio”, de acordo com a edição de 2014 do relatório Liberdade Religiosa no Mundo, que avalia
196 países. Preparado pela Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), organização
internacional dependente da Santa Sé, o documento será apresentado no auditório
da Assembleia da República, a partir das 17h desta terça-feira, dia 4 de Novembro, com a presença
do arcebispo libanês de
Bekaa, Issam John Darwish.
Outra conclusão importante do
relatório é que, entre os casos de violações mais graves da liberdade
religiosa, predominam países de maioria muçulmana e onde os governos usam a
religião para impor regimes autocráticos e ditatoriais.
De acordo com informações da
Fundação AIS em Portugal, o estudo conclui ainda que “a perseguição das minorias religiosas” e o aumento dos
estados uniconfessionais está a provocar uma vaga muito elevada de populações
em fuga, o que tem contribuído para a “crise mundial de refugiados”.
Michael Gulbenkian
participa também na apresentação do relatório. O arcebispo Darwish, anuncia a
AIS, irá falar sobre a liberdade religiosa no Líbano. O país está confrontado
com uma forte ameaça de colapso económico e político por ter acolhido, nos
últimos anos, milhares de refugiados provenientes da Síria e do Iraque.
“Pelas armas não se muda nada”
A presença de Issam Darwish em Portugal integra a campanha
da AIS no sentido de sensibilizar a população portuguesa para a violência que
estão a sofrer os cristãos do Médio Oriente. Nos últimos dias, no âmbito desta
acção, esteve em Portugal o patriarca Gregorios III, da Igreja Católica Greco-Melquita, com sede em
Damasco (Síria),
que concelebrou mesmo a eucaristia do dia de Fiéis Defuntos, na sé patriarcal
de Lisboa.
No mesmo dia, em entrevista a Sofia Lorena, no Público, o patriarca Gregorios dizia: “O que temos de ver é que pelas armas não se muda nada. São
fáceis de conseguir, mas não levam a solução nenhuma”. E acrescenta: “É
irresponsável que os grandes países pensem que vão resolver esta situação com
armas, é uma tontice.” Para este responsável, “se a América e a Rússia já
tivessem alcançado algum acordo que preservasse os seus interesses estaria tudo
bem”. E acrescenta: “A paz não chega porque falta esse consenso. A América e a
Rússia não querem saber de democracia na Síria.” (o texto pode ser lido aqui na íntegra)
No final da missa de domingo, o patriarca lançou um apelo aos
portugueses, no sentido de mobilizar todas as vontades para que a paz prevaleça
no seu país.
“Não há nenhum lugar seguro na Síria. Podemos pensar
que há lugares mais seguros do que outros, mas em qualquer momento podemos ser
mortos por uma bomba, um míssil ou uma bala, já para não mencionar ser raptado
ou feito refém em troca de um resgate, ou simplesmente assassinado… O caos
ameaça todos, em toda a parte, a cada momento”, disse o patriarca, fazendo um
retrato do que se vive no terreno, neste momento.
“O perigo paira sobre todos os
cidadãos, especialmente os cristãos”, acrescentou, “devido à destabilização e
ao caos nos bairros residenciais provocados pela exploração, em especial dos cristãos,
mas também de outros grupos religiosos.” E há ainda “o perigo de pessoas,
casas, igrejas e mesquitas serem usados como escudos, e o perigo de se
incitarem motins religiosos entre cristãos, muçulmanos e drusos”, acrescentou
no seu apelo.
“O futuro do Cristianismo na Síria
está ameaçado, não pelos muçulmanos, mas pela actual crise, devido ao caos que
ela provoca e à infiltração de grupos islâmicos fundamentalistas, fanáticos e
incontroláveis”, acrescentou, num trágico retrato da situação no terreno e que
terminou com uma oração (texto para ler na íntegra aqui)
No final da celebração, o
patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, afirmou que o pedido do patriarca
greco-melquita não seria esquecido.
O êxodo dos cristãos e o caso de
Asia Bibi
O êxodo dos cristãos da Síria, do
Iraque e, em geral, de todo o Médio Oriente tem sido uma das consequências
graves da guerra e dos conflitos que atravessam a região. Em Julho, num outro
texto, ainda no Público, Sofia Lorena
dava conta de alguns números e histórias.
Desde o início de 2011, recorda a AIS, a guerra civil na Síria já matou
mais de 150 mil pessoas e deu origem à maior crise humanitária contemporânea.
Mais de oito milhões de pessoas perderam as suas casas e estão refugiadas
algures no país ou a viver em campos de refugiados no Líbano, Jordânia, Turquia
ou outros países da região, recorda a AIS, que tem apelado a uma resposta
solidária contra a ameaça do auto-proclamado “Estado Islâmico”, que domina
vastos territórios entre a Síria e o Iraque e tem aterrorizado a presença da
ancestral comunidade cristã na região.
A visita dos dois responsáveis cristãos marca uma campanha mais
intensiva da AIS em favor das comunidades cristãs da região e que, já esta
semana, passará ainda por uma conferencia do arcebispo Darwish, em Fátima, no
próximo sábado, dia 8 (Casa Nossa Senhora das Dores, a partir das 15h).
Um pouco mais para leste, um dos
casos que nos últimos dias voltou ao topo das notícias foi o da cristã Asia Bibi,
acusada e condenada à morte, há cinco anos, por blasfémia – na realidade, terá
sido acusada por beber água de um poço supostamente reservado a muçulmanos,
como contava Anne-Isabel Tollet, autora de Blasfémia (ed. Alêtheia), numa conversa que tive com ela há três anos.
Asia Bibi viu a sentença ser há
dias confirmada e escreveu uma carta ao Papa pedindo que ele reze por ela.
O secretário-geral do Conselho
Mundial de Igrejas, Olav Fykse Tveit, expressou a sua consternação pela confirmação da condenação
à morte. Garantir a justiça em casos como os de Asia Bibi é fundamental para
promover a tolerância, a harmonia religiosa e a protecção dos direitos das
minorias religiosas, disse Olav Tveit.
2 comentários:
E quanto a perseguição que a Igreja Católica impõe onde ela domina e oprime as minorias, sejam elas quais forem, inclusive cristãs? Engraçado mas esse relatório é extremamente tendencioso!
Três notas ao comentário anterior: 1) tendencialmente, preferimos publicar comentários assinados; neste caso, publico para poder de novo dar esta explicação; 2) leu já o relatório (disponível online em português aqui: http://www.fundacao-ais.pt/cms/view/id/3261/) Não me parece que seja tendencioso, pois regista casos relativos à perseguição de todos os crentes, independentemente do seu credo; 3) e onde é que vê a Igreja Católica a dominar e oprimir minorias? Parece que a sua observação parou algures nos séculos XVI e XVII e não se refere à actualidade... Ao dispor. António Marujo
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